Maysa no paredão
Toda pessoa inteligente sofre muito. Eu sofro.
Ela não gosta da palavra volta. Porque acha que só volta
quem partiu (e ela não partiu). “Sou um pouco barco de pesca, vou ali e já
venho.” De qualquer forma, Maysa retorna ao Canecão, desta vez muito bem
acompanhada de Luizinho Eça. Foi fácil estrear, porque os dois já estavam
ensaiados para uma temporada em teatro que acabou não dando certo (não por
culpa deles). Há um ano, ela fazia uma temporada no mesmo Canecão, mais magra e
mais corajosa do que nunca. A casa ficava cheia todas as noites: muita gente
que nunca tinha entrado lá mudou então de ideia. Depois disso, outros artistas
também mudaram e passaram a cantar não mais apenas para uma pequena elite. Alguns
desistiram em cima da hora – mas isso é outro problema. A verdade é que Maysa é
novamente um marco dentro da noite carioca. E pede: ouça!
Reportagem de David Rangel · Foto de
Raimundo Costa
Eliana Pittman (cantora)
-
No tempo em que você começou a cantar, ia sempre para a
boate Cave, em São Paulo, onde ficava até a madrugada. Lá trabalhava meu pai,
Booker Pittman, que me contava tê-la acompanhado muitas vezes. Eu quero saber,
porque você nunca deu uma palavrinha sobre essa pessoa formidável que você
conheceu no início da sua carreira?
-
Eliana, você está muito enganada. Inclusive – engraçado –
você vai ficar sabendo que agora no meu próximo show, no Canecão, um dos meus
músicos e eu vamos cantar uma canção feita para o Booker. Agora, acho que
quando uma pessoa gosta da outra não precisa anunciar aos quatro ventos. A
gente gosta é no coração, não na boca. Booker sempre esteve no coração. E uma
palavra minha não ia aumentar em nada a magnífica arte que ele sempre teve.
-
A sua fonte de composição secou ou você perdeu o
endereço do guitarrista e compositor Baby, que tocava no Cave?
-
(Maysa fica espantada.) Se eu perdi o endereço do Baby?...
olha, nunca ninguém me perguntou isso. Acho que você também deve ter perdido.
Eu não perdi, não. Baby nunca fez nada comigo, apenas me acompanhava. A minha
fonte de inspiração não secou, não. Estou voltando a compor e o Menescal
musicando. (uma pausa para aumentar a irritação.) E se secou, isso é um
problema meu. Não é seu. Agora, que o Baby quem fez as minhas músicas, eu gostaria
que provasse. Traga o Baby.
Paulinho Tapajós (compositor)
-
Você não acha que se afastando tanto do Brasil, acaba
prejudicando um pouco sua carreira e sua popularidade?
-
Paulinho, estou de volta há um ano. Até fizemos um disco
lindo com músicas suas, não é? Eu não acho que essas viagens prejudiquem minha
carreira, porque enquanto estou lá fora, faço o quê gosto: cantar. Olha, minha
popularidade já ficou provada por A + B, quando voltei no Canecão e enchi
aquela casa três meses de terça a domingo. Muitos, só os fazem nos fins de
semana. Era gente que ia ouvir o Ouça, Meu Mundo Caiu, Por Causa de Você, de Dolores
e um pouquinho de Antônio Maria na minha voz. Para minha grande alegria, senti
que essas saídas do Brasil não tem nada de negativo. Mesmo porque, afinal,
estou divulgando o que é nosso, não é?
-
Qual o disco você considera o mais importante em sua
carreira? Porque?
-
Esse disco ainda não existe. Tudo o que fiz foi
importante. No momento. Não sei, eu podia dizer, talvez, O Barquinho, que foi
gravado em 60. Era tão bom disco, tão anticomercial que a CBS resolveu
retira-lo, calmamente, da praça. Aquele era um disco certo, muito bom mesmo.
Agora, o disco mais importante ainda estou pra fazer.
José-Itamar de Freitas (jornalista)
-
Uma grande cantora, que só canta o que quer e o que
sente. Uma mulher inteligente, corajosa, passional, desaforada, incapaz de se
curvas às conhecidíssimas conveniências. Esta, Maysa, a sua imagem perante a
maioria do público – eu, inclusive. Esse “fazer o que quer” não custa caro
demais a um artista? Vale a pena ser independente, livre, quando se é artista?
Consegue-se, mesmo, ser livre, independente?
-
José-Itamar, você acha que realmente uma pessoa é livre e
independente, quando tem que responder a uma pergunta como essa? Acho que só se
é livre quando existe a opção pra poder dizer “eu não quero responder” ou
“quero que você se dane”. Eu não sou independente nem livre, porque, sendo
artista, tenho compromissos com o público e comigo mesma. Sinto bastante o peso
da palavra artista. Olha, ninguém consegue ser independente e livre. Nem os
próprios hippies. Agora, desaforada eu sou, quando pisam meus calos. Enfim,
acho que vale a pena, ao menos, se tentar ser independente e livre.
-
A comunicação fez da terra um “pequeno mundo”. Não lhe parece
difícil a sobrevivência dos chamados “ritmos nacionais autênticos”? Você não
acha que ninguém conseguirá evitar a universalização da música popular? Está
certo o compositor que faz o que tem vontade de fazer, desde que com
consciência e talento?
-
Graças a Deus alguém me perguntou isso. A única coisa
certa é o compositor fazer o que tem vontade, desde que tenha consciência e
talento. O cantor também só deve cantar o que quer e o que sente. Agora, eu
queria que você me dissesse o que é “ritmo nacional autêntico”? De onde vem?
Claro que não é do Brasil. Não tem nada disso. É o sambão? O sambinha? O afro?
Olha, todos vem de um lugar só. Acho que é válido tudo que a gente sinta e que
comunique, como você mesmo diz. Realmente, vai ser muito difícil evitar a universalização
da nossa música. Do jeito que se faz a sua divulgação e do jeito que entra a
música estrangeira aqui, é quase impossível mesmo. (Maysa fala rápido e muito
irritada.) Olha, Milton Nascimento que muito americano funde a cuca ouvindo sem
entender, está aí jogado. Edu Lobo está lá fora preso a um contrato com Sérgio
Mendes, sem poder fazer nada antes de pedir permissão ao patrão. O carrasco
Sérgio Mendes virou o Xavierzinho Cugat de lá. Manda e desmanda em todo mundo.
O Milton Nascimento gravou um disco nos Estados Unidos que não teve a menor
divulgação. Cadê a máquina? Olha, eu não tenho pinimba com o Sérgio, não.
Agora, o que ele fez em favor de nossa música foi uma piada. (Maysa se exalta
mais.) Como é que um brasileiro sai do Brasil, pega duas cantoras americanas
para cantar nossa música? Será que não temos cantoras excepcionais aqui?
Algumas estão passando até fome. Olha, depois de Carmen Miranda eu fui uma das
primeiras cantoras a sair daqui para cantar português lá fora. E no Blue Angel,
uma das melhores casas de Nova Iorque. Não é papo-furado, não. Gravei até disco
na CBS, que já mandava lá naquele tempo. Fui uma das primeiras a cantar no
Olympia, de Paris. E foram doze músicas brasileiras. E cadê a máquina? Se ela
tivesse agido como age com pseudovalores, já naquela época teria dado certo a
divulgação da nossa música. Não posso deixar de citar Carlos Lyra, um dos
maiores compositores brasileiros. Esquecido lá no México, não tem nem um
convite para visitar o Brasil.
Gérson (costureiro)
-
Maysa, você acha que o artista precisa sofrer para ser
verdadeiramente artista?
-
Olha, Gérson, acho que, na época atual, toda pessoa
relativamente inteligente sofre. Agora, se o artista precisa fabricar o
sofrimento, isso não é problema meu. Sofri muito. Não posso responder pelos
outros. Comecei a cantar menina ainda, obrigada. Como vou explicar? Fui lançada
numa máquina de horror. Um pavor que era alguma coisa fora do comum. Talvez por
isso eu me metesse em boates pequeninas, para ficar mais protegida. Hoje, sofro
demais, mas tenho consciência para dizer não às coisas e dar o devido valor a
cada uma. Antes, era só medo.
-
Maysa, você como artista tem procedimento correto e
digno de uma profissional. O que acha de quem vive provocando escândalos para
se promover?
-
A imprensa, antigamente, dizia que eu também fazia isso.
Pura mentira. Vai ver que as pessoas a que você se refere também não fazem o
que você pensa. Contar certas coisas de artistas não é uma forma de vender
mais? Olha, o Carlos Imperial é sensacional. Dentro do que ele faz, seu valor
está na cara. Mas tem muita gente que me recuso a conhecer, ver e ouvir. Ao
Agnaldo Timóteo, só consegui assistir duas vezes na televisão. Não gosto do ar
debochado e fabricado do Martinho da Vila. O Osvaldo Nunes, assim mesmo só vi
uma vez, assim mesmo porque fiquei com pena de ele ser massacrado num programa.
É muito ignorante para poder responder a perguntas. O Antônio Marcos também me
incomoda muito. Mas, acho que, se se preparasse, talvez pudesse tornar-se um
homem inteligente.
Teresinha Pittigliani (sociedade)
-
Sou grande admiradora de seu talento artístico e de
Maysa – mulher. Você que morou tanto tempo fora do Brasil, como viu nossa
música lá e como vê a nova música popular brasileira agora?
-
Teresinha, a nossa música lá fora, infelizmente, ainda
está naquela de quando você chega a tocar o Tico-Tico no Fubá em ritmo de
chá-chá-chá. Pelo menos enquanto eu estava lá. Podem desmentir, mas é isso
mesmo. Nos Estados Unidos, Tom Jobim tem muita força. Considero-o música brasileira,
apesar de muita gente dizer que a Bossa Nova não é. Ela, realmente, tem raízes
de jazz, mas foi a partir dali que as letras começaram a ser cuidadas, ficando
mais bonitas e lógicas. Muito diferentes daquele bestialógico de antes. Sérgio
Mendes não me toca como música brasileira. Ele mesmo diz que faz música
internacional. Sérgio ajeita da sua maneira pra ganhar dinheiro, o que não
deixa de ser válido. Hoje, aqui, todo mundo está confuso, com medo e vergonha
do vizinho. Todos querem fazer coisa nova, esquecendo que música é uma coisa
só. Não existe nada novo. Se não fosse isso verdade, como é que iam ficar os
grandes clássicos? É o ritmo não sei de que, é o fulaninho não sei de que...
infelizmente, nossos grandes valores estão lá fora. Desses, eu respeito muito o
Caetano. Gil não gosto muito. Sou mais o Cae, entende? Edu Lobo é sensacional.
Vou cantar no show uma música dele – Canção do Amanhecer, com roupagem
belíssima de Luizinho Eça. Fico arrepiada só em falar. No Brasil, acho que cada
um devia ficar na sua. Nada desse negócio de “fulano está gravando bolero”,
“fulaninho está gravando não sei o que” etc.
-
Maysa, você agora está uma uva. Isso lhe custou muito
sacrifício? O que pensa sobre a mini e a maxissaia?
-
Não, Teresinha, não me custou não. Um dia, cheguei em
frente ao espelho e achei que minha figura agredia a mim mesma. Porque, então,
agredir ao público que eu começava a amar? Quando me maquilava o suor me
aterrorizava (tenho verdadeiro pavor de gente suando. Não sei o que é isso.
Qualquer dia vou perguntar ao meu psicanalista). Enfim, sentia-me feia,
antiestética. Para emagrecer, tive de deixar muita coisa. Nunca fui de muito
comer, mas a bebida deixei mesmo. Quase nasci de novo, mas acho que valeu a
pena. Sinto-me muito diferente, não sei se por causa do físico. Aquele instinto
de defesa ante as pessoas que eu tinha, acabou. Antigamente, jamais responderia
a este Paredão. Não tinha paciência e me sobrava pavor. Hoje, estou aqui nessa
guerra, ávida pela curiosidade dos outros e com o maior prazer. Quanto à moda,
Teresinha, sou muito esquisita. Se quiser botar minissaia, eu boto. Só gosto de
máxi acompanhada de uma botinha. Agora, acho que a mulher não deve se
escravizar a esse negócio de moda. Eu ponho o que acho bonito.
Roberto Menescal (compositor)
-
Maysa, há dez anos você me deu aquela tremenda colher
de chá, gravando o LP O Barquinho.
Aquilo praticamente me lançou no meio musical. Agora, nós vamos partir para
outro disco. Você acha que este navio pode fazer sucesso igual ou maior que O Barquinho?
-
Menesca, a mesma colher de chá que você diz que eu lhe
dei, você me deu com o seu Barquinho. Com ele, praticamente, nasceu um caminho
imenso pra todos nós da Música Popular Brasileira, inclusive eu. Quanto ao
nosso novo disco, esse navio que vamos lançar agora, faço questão que tenha
muito mais sucesso que aquele Barquinho, que, infelizmente, era tão pra frente
que foi retirado da praça.
-
Porque você não para com essa mania maluca de andar
viajando o tempo todo e fica com a gente para toda a vida?
-
Se eu pudesse ficar com gente como você, meu querido, eu
nunca mais saía daqui.
Miriam Moreira da Costa (sociedade)
-
Como você consegue conciliar ser uma boa mãe e uma
grande artista?
-
Miriam, eu acho que uma coisa nada tem que ver com a
outra. Principalmente, no meu caso com o filho que tenho. Jayminho, muito
inteligente e vivo, participa da minha carreira de maneira tão entusiasmada que
faz questão de tudo o que faço e saber das coisas para debater comigo. Ele não
separa a mãe da cantora. Daí...
-
O que você pensa, sinceramente, dos festivais de música
popular? São realizados com seriedade ou há movimento de protecionismo nos
bastidores?
-
Acredito que haja sim. E bastante. Participei de dois
festivais. Agora, não dou nome aos bois por uma razão muito simples: estava por
fora e não sei quem foi o ajudado. Só sei que a música brasileira é que não
foi. Olha, em todos os nossos festivais internacionais, o que aconteceu? A
nossa música continuou no seu buraco e a estrangeira entrou com toda a força
aqui.
Miguel Azanza (empresário)
-
Maysa, você ia fazer temporada no Teatro da Praia e,
agora, decidiu ir para o Canecão. Porque?
-
Ah, seu danado, você é meu empresário, meu marido e não
sabe? É muito simples, Miguel. Você sabe disso melhor que ninguém. A gente deve
fazer as coisas que nos gratifiquem. Podem até achar que é covardia eu querer
voltar só ao Canecão, porque conheço o local. Não é. Quando ainda não conhecia,
eu também fui. É que me senti dialogando de tal maneira com aquela gente
toda... eu achava tão formidável ver a Teresa Sousa Campos ou outra qualquer
sentada ao lado do faxineiro do meu edifício! Todos na mesma linguagem,
recebendo a mesma mensagem. Todo mundo encantado, não por mim, mas pelo
conjunto de coisas. Olha, aquilo tudo me gratificou de tal modo, que eu descobri
uma dimensão dentro de mim – para mim – que não sabia que tinha. Então, se
nunca mais fizesse nada na carreira, a experiência do Canecão tinha valido. A
gente deve voltar ao lugar, onde sente que está a sua verdade. A minha está lá.
-
Você que foi a primeira cantora de gabarito a se
apresentar no Canecão, a primeira a ter coragem de enfrentar uma plateia tão
grande, tem recebido alguma demonstração de agradecimento dos artistas a quem
você abriu o caminho e que agora lutam pra serem contratados?
-
Confesso que quando fui lá pra dentro, não esperava nenhum
agradecimento. Afinal de contas, alguém tem de ser a primeira. Mas vou contar
uma coisa: em 58, os salários na TV começaram a subir quando eu comecei a
cantar. Eu recebia 120 contos mensais na TV Record. Dinheiro pra burro. Agora,
em 69, aconteceu a mesma coisa. Mas eu não espero agradecimento nenhum, não.
Hilton Gomes (locutor)
-
Porque você voltou ao estilo original? Foi reação do
público ou você acha que Meu Mundo Caiu é
mais forte do que a bossa jovem?
-
Hilton, essa pergunta eu já respondi assim umas mil vezes.
Aquele sloganzinho A Nova Maysa – não existe. O que existe é uma Maysa com dez anos a
mais. A fossa eu não comprei, não exagero, nem vivo dela. É uma coisa que está
presente dentro de mim. A nova Maysa tem os mesmos problemas e angústias, as
mesmas coisas. Só que consciente deles, porque dez anos deram pra me amadurecer
um pouco. Enfim, não existe a nova Maysa.
-
O que você sente quando canta Ouça e quando canta música da juventude?
-
Ouça, quando eu
fiz, foi uma carta com mensagem direta. Foi uma coisa minha que saiu para
determinada pessoa numa determinada época de minha vida. A música do Roberto
Carlos que eu cantei, senti no mesmo momento: “Se você pensa que vai fazer de
mim/o que faz com todo mundo que te ama/é melhor saber que você vai ter que
mudar.” Isso é um negócio superagressivo, que a gente tem vontade de dizer a
muita gente. Por isso, é que Ouça e Se Você Pensa, pra mim foram dois recados.
“Não
acho que sou melhor do que os outros, e se achar, isso é um problema meu. Mas
jamais vou me render a maquina que despersonaliza as pessoas”
Diva Pierante (cantora lírica)
-
Maysa, o nosso célebre Coelho Neto, falando de
improviso numa conferência em Juiz de Fora, disse sobre os olhos verdes:
“Refletem uma profunda nostalgia e tristeza, contrapondo uma excessiva bondade
e esperança.” Coelho Neto tinha razão?
-
(Maysa sorri, os olhos grandes e verdes se abrem mais
ainda.) Olha, eu nunca li Coelho Neto. Mas, acho que ele tinha razão.
Nostalgia, tristeza, bondade, esperança... é, Coelho Neto tinha razão. Porque,
não sei.
-
Maysa, um cantor, popular ou lírico, deve fazer
qualquer coisa para alcançar a popularidade. Por exemplo, extravagâncias como
Alcebíades cortando a cauda de um cão ou Diógenes dormindo num tonel?
-
Desde que não entre em conflito com seu ego (que não se
desrespeite) tudo é válido. Eu jamais vou me render à máquina
despersonalizante, entende? Não quero dizer que sou melhor que os outros, não.
E se achar, isso é um problema meu. Agora, estou sentindo que a convivência com
tudo está começando a pifar. Olha, se eu não estivesse com vontade mesmo de
fazer esse show, metia-me numa ilha deserta pra ler, ouvir música e criar base
pra ir mais adiante, entende?
Albery (pintor)
-
A bebida está primordialmente inserida na sua alegria
de viver?
-
Antigamente, a bebida chegou a ser uma bengala para mim.
Precisa dela para viver, porque recebia pressões na minha vida particular e a
imprensa fazia dela o seu prato do dia a dia. Hoje, a imprensa e gente como
você tem outras coisas para pensar. Então, o problema da bebida passou a ser só
meu. Ela é importante como comer, viver, respirar e qualquer outra coisa. Para
emagrecer, além da comida, tive de abdicar da bebida. Tem-me dado momentos bem
agradáveis. Mas, eu nunca me deliciei com o gosto, só com os seus efeitos.
Olha, comecei a beber por necessidade. Foi quando abandonei minha casa e minha
vida em São Paulo. A bebida era um derivativo, uma ajuda. E aquilo foi me
fazendo mal. Demorou dez anos para que concluísse que meu corpo não aceita a
bebida. É quase uma reação química. Isso é ruim para mim, porque eu gostaria de
beber de vez em quando. Mas não consigo. Uma só não dá, tenho de tomar todas.
Então, é melhor não beber. É mentira que eu tenha voltado a beber. Tomei dois
pileques na rua, sim. E daí? O que os outros tem a ver com isso? Tenho o
direito de fazer o que eu quero.
-
A velhice lhe mete medo?
-
Não, absolutamente. Não penso, nem jamais pensei nela.
Luís Martins (jornalista)
-
Maysa, conheci você e conversamos pela primeira e única
vez num programa de TV Almoço Com as Estrelas.
Achei-a extremamente simpática e comunicativa. A impressão que eu tinha, lendo
jornais e revistas, era a de uma criatura amarga, e por vezes, agressiva. Em
sua opinião, qual a sua verdadeira personalidade? Como você mesma se vê?
-
Com gente como você, Luís, que foi tão amável e carinhoso,
eu não posso ser amargurada. Naquele programa em que conversamos todo o tempo,
acho que, mesmo se estivesse na fossa, você teria me ajudado a supera-la. Essa criatura
amarga e agressiva também tem seus momentos de carinho. Quando você me dá
carinho, eu não posso responder com uma agressão. Maysa é amarga, agressiva nos
momentos próprios – que são a maioria no tempo em que vivemos – gosta de
receber e sabe dar muito carinho também.
-
Com a experiência de dois mundos totalmente diferentes
– alta sociedade e o artístico – me esclareça: O último não lhe parece, às
vezes, uma feira de vaidades tão frívolas e vazias quanto o outro?
-
Você tem toda a razão Luís. É por isso que optei por uma
coisa mais cômoda – talvez mais covarde – que é o meu mundo pessoal. É mais
cômodo ficar dentro da minha casa, lendo meus livros, fazendo o que eu quero,
dialogando com o meu marido e com os poucos amigos que tenho. Olha, nem o mundo
da sociedade nem o artístico me interessam. Talvez até pare com tudo dentro de
dois anos.
Antônio Marcos (cantor)
-
Maysa, você segue rigorosamente os critérios do diretor
artístico da sua gravadora quando faz um disco?
-
Olha, condição sine qua non nos meus contratos é que ele me de
plena e total liberdade para fazer o que acho certo. Ninguém melhor do que eu
pode saber o que tenho vontade de cantar e o que não tenho. Olha, isso é
exatamente o que você tem de fazer, Antônio. Libertar-se. Sinto que você está perdido,
fazendo mil perguntas, procurando cantar só essas musiquinhas de parada de
sucesso. Já observei você muitas vezes na TV e noto uma incrível angústia.
Parece que você quer falar alguma coisa que não pode e outras mais. Você tem
que ter coragem e deixar de ser um cantor fabricado, partindo para a sua verdade.
Condições para se recuperar você tem. Ainda me lembro bem de um festival da
Record, quando cantou uma música que chegou a me arrepiar. Sua voz, aquele dia,
estava uma coisa muito séria. Parece que você se esqueceu desse Antônio Marcos
industrializado que é.
-
Na realidade, poucos artistas brasileiros conseguiram
fazer sucesso lá fora. Você viajou muito. Qual o brasileiro de sucesso no
exterior?
-
Até agora, Carmen Miranda e Sérgio Mendes. Só. Para uma pequena
elite de países onde foram, incluo Elis Regina e Chico Buarque de Holanda.
Elis, onde esteve, é conhecida como a grande cantora que realmente é. Eu, em
Portugal, sou conhecida como aqui. João Gilberto teve tudo nas mãos para se
tornar um deus nos Estados Unidos, mas foi muito displicente. Agora, para o
grande público, de brasileiro só existem os dois primeiros mesmos.
Maysa, a famosa cantora no Paredão desta semana, volta a ser uma das grandes atrações da noite carioca.
com quem foi casada?
ResponderExcluirQuelle belle chanson :Toi si loin de moi par Jean Sablon!
ResponderExcluirSaudade