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26 de março de 2019

O último amor de Maysa - Radiolândia, 12/1961



     Cantar descalça ante as câmeras da tevê, sentada contra o encosto da cadeira, o microfone em uma das mãos e o cachorrinho americano na outra – e cantar bem como sempre – convenhamos que isso não é para qualquer um. Mas o é para Maysa, que nesse estilo surpreendeu ao público da TV Record, em São Paulo, na atual temporada de audições exclusivas às 20 horas de segunda-feira. Uma bossa novíssima, como se vê.
     Igualmente, iniciar temporada com os programas coproduzidos por seu amor de então, Ronaldo Bôscoli, que também funcionava como empresário da estrela, e com acompanhamento a cargo de um conjunto exclusivo, o do pianista Roberto Menescal, que viajava do Rio especialmente para tal fim, concordemos que à primeira vista era novidade. Mas não o era em verdade... Pois se tratava de Maysa.
     E o quadro de surpresas se completa após saber-se que poucas semanas após Maysa rompeu com o noivo empresário, desistiu do anunciado casamento em Paris em março do próximo ano, dispensou o pianista e tornou a calçar os sapatos para defrontar o público. Conforme se verifica, o destino continua a sacar na caixinha de surpresas portada a tiracolo por Maysa.
Mas esses incidentes, como no passado, passam sem deixar marca visível na fisionomia, no temperamento e na própria carreira de Maysa. Ela mesma confessa à reportagem:
- Nada de extraordinário entre mim e o Ronaldo. Amamo-nos alguns meses, que não repudio em minhas recordações sentimentais, mas – como dizem atualmente os cronistas políticos – um dia o amor esvaziou-se de conteúdo, daí a separação consequente. Coisas normais à vida de quem vive intensamente e com sentido aos minutos desperdiçados. Sem mágoa a separação, creia. Quanto a cantar descalça, começou durante minha última temporada em Buenos Aires. Cantando numa boate, sentia certa noite os pés em fogo, afetando-me naturalmente os nervos. A certa altura não aguentei mais: perdi o acanhamento e tirei os sapatos. Que alívio para a matéria e o espírito! Pois a turma presente gostou, no dia seguinte os cronistas me designavam como “a princesa descalça” e vi-me impelida, também por gosto, a exibir-me desse jeito. Não se tratava, porém, de um estilo que eu forçava por impor. Apenas com os pés descalços me sentia muito mais à vontade – só isso. Nos meus últimos programas na Record, entretanto, tornei a calçar-me devido a inúmeros pedidos para que eu voltasse a apresentar, ao invés de apenas músicas da bossa nova, como vinha fazenda, também as minhas criações do início da carreira. E como respeito o público, embora pareça o contrário, não vacilei em atender a essas solicitações, naturalmente sem os pés descalços  para não descolorir o ambiente com relação às minhas primeiras músicas. No entanto o “barquinho” da minha vida navega conforme eu quero: a velas soltas.
     E o que Maysa não comenta, talvez por considerar desnecessário, é que, não obstante as tropelias impostas pela vida artística e a circunstância de sua pessoa constituir sempre uma notícia em potencial – com espaço permanente aberto nas colunas da imprensa – é que não lhe faltam contratos em parte alguma, no Brasil ou no exterior, em rádio, televisão, boate e shows avulsos. Por exemplo: o atual patrocinador de sua temporada no Canal 7, em São Paulo (Cestas de Natal Amaral), não apenas não levanta objeções às “esquisitices” da artista frente às câmeras, como pretende mesmo ampliar a promoção publicitária deste ano mediante a apresentação de Maysa – ao vivo e em vídeo tape – em diversas outras capitais do país. Se isso não representa prestígio, apesar de todas as outras “ondas” em contrário, difícil dizer o que o seja.
Por isso, pode-se dizer sem receio de erro que, não obstante as “surpresas” que com frequência oferece ao público – ou talvez por isso mesmo – Maysa continua Maysa...



(Matéria publicada originalmente na revista Radiolândia em dezembro de 1961.)


24 de abril de 2018

O último álbum de Maysa




Encarte do álbum.

Notas do diretor – responsável

Aproveitamos a presença de Oscar Castro Neves por algumas semanas no Rio. Juntamos Oscar e Maysa para preparar as “bases” do disco. As “bases” consistem nas gravações do canto acompanhado somente por violão, piano, baixo e bateria. As gravações foram feitas à noite pelo técnico Toninho. Depois das “bases” prontas vem a vestimenta. Aí, entrou o Gaya com suas cordas, metais, percussão, etc. o responsável técnico dessa fase foi o Nivaldo Duarte. E aí estão 8 canais prontos para serem mixados, isto é, colocar tudo em seus devidos lugares, no seu devido balanço. Isso também foi feito por Nivaldo com a supervisão de Jorge Teixeira. Nesta altura Milton Miranda achou tudo uma joia.

TUDO POR CULPA DE UM SUJEITO

Da sua cobertura em Copacabana ela espia o mar, lá longe. Aquele par de olhos de gata – gata arisca – levam suas vontades no lá longe do infinito. Daquele mar, seus pensamentos antigos. Suas viagens pelo mundo, suas cantigas espalhadas, seu nome escrito em idiomas diferentes, seu trilhar na base do “Oropa, França e Bahia”. Quem mandou? Quis ser cigana, que seja, e deixe de lado a coisa doméstica do dia a dia, da conta da luz, do gás, do telefone, a luta de não ter soja hoje como banha Rosa amanhã. Sabe, isso sim, o que é de sabor de estrela, de lua, de céu sem bruma e sabe mais nos versos que canta sua imensa solidão. É ela só e seus olhos de gata, companheiros constantes. Agora ela se encolhe, depois de debruça sobre o papel e faz um verso ou se alonga no braço pelo pincel e traça na tela a face branca e triste de um palhaço. Estranha mulher, essa Maysa, que tem um mundo de amor pra dar, e se esconde numa incerteza que é medo puro. Seu disco?
“Em 57 gravei o meu primeiro. Ele se chamou ‘Convite para ouvir Maysa’. E faturei com o mesmo título o Nº 2, Nº 3, Nº 4 e lá se foi a numeração. Cantei meu primeiro disco em 1974. Aí passei a ser para mim mesma um convite para ouvir-me. Tudo por culpa de um sujeito chamado Aloysio de Oliveira que por saber o quer, faz a gente descobrir coisas dentro de nós.
Discordamos de muita coisa, como por exemplo, o tratamento da música “Rasguei a Minha Fantasia”, mas ele é tão tinhoso que eu acabei concordando e gostando de tudo. A alegria que existe em determinadas faixas como “Agora é Cinza” não é bem como se sente pela primeira vez. É preciso ouvir de novo e descobrir quanta sutileza ela contém. Nesse disco ficou revelado publicamente o meu amor a Oscar Castro Neves. E quanto ao Gaya... Bem esse é um monstro!”

MAYSA – UMA CAMINHADA SEGURA

O artista aquele, desses dias de hoje, enche a boca quando diz que vai se apresentar no Olympia, de Paris. Isso, nessa hora de agora, nesse vale tudo da vida – pisar naquele palco já não é mais uma grande jogada. As portas do Olympia estão ultimamente muito francas, e seu dono, não está fazendo muita questão de escolha e, tanto faz uma trupe de cachorros amestrados, como um louco cantor de qualquer canto, que tenha cabelos verdes, se pinte de forma andrógina, e faça faturamento na bilheteria e estamos conversados em francês. Mas, no calendário de dez anos atrás a coisa era diferente. Era precisa o aval de uma Piaf, a garantia de um Sacha Distel, um oui de Jacques Brel, para que uma audiência experimental fosse conseguida.
Estamos em 1963 e Maysa está em Paris. Os jornais escrevem seu nome certo, com “y” no meio, e os fotógrafos tem diante de seus olhos uma moça de 26 anos, gorda de rosto, de corpo e de alegria. Na véspera da sua estreia o “France Soir” escreve assim, no escuro: “elle ést trés brune, du genre ‘opulent’ e brésilienne. Dans son pays, on la considère comme l’une de plus grandes vedettes de la chanson. Elle s’appelle Maysa, tout simplement; e la bossa nova – oui, vous savez, cette samba, ‘nouvelle manière’ importé par Sacha Distel est son royaume! Parmi les neuf chansons qu’elle va, pour ‘son publique parisien’ interpreter en français, en espagnol et en portugais. Maysa a inscrit deux de ses compositions (brésiliennes): ‘Ou çá?’ déjà enregistrée par Jean Sablon, et ‘Souvenir’. Il y aura aussi ‘Je voudrais rencontrer un grand amour’ et ‘Ne me quitte pas’, de son ami e idole Jacques Brel, qu’elle déjà allée entendre trois soirs sucessifs depuis son arrivée.”


A partir do minuto 3:48 Aloysio de Oliveira e Maysa comentam sobre o disco. Especial da TVE gravado em Maricá, 1974.


Eu não gosto de vender minha arteO Globo, 2/12/1974

Maysa não gosta que se fale em volta, pois para ela, não houve partida. Parou porque queria descansar em sua casa na praia de Maricá, longe da máquina, da pressa, que não lhe agrada. Para ter-se uma ideia de seu atual ritmo de vida, basta lembrar o tempo de produção de seu novo disco: um ano.
- Quando Aloysio de Oliveira – que é o produtor do LP – sugeriu que fizéssemos um disco, aceitei de imediato, pois sabia que tudo seria feito do meu jeito. Em dezembro do ano passado, começamos a trabalhar no disco, com muita calma, pois não gosto da pressa que caracteriza as gravações, hoje. Todo mundo só pensa em acabar logo e colocar o disco à venda. E eu não gosto de vender minha arte.
Por isso, Maysa nunca pensou em crise na indústria fonográfica e não está preocupada em saber se o seu disco vai vender ou não. Diz que o importante é o disco mostrar o que vai dentro dela. No repertório, só músicas antigas, que ela queria gravar a muito tempo: “Castigo”, “Fim de Caso”, “Agora é Cinza”. De novidade, um tema da novela “Eu Compro essa Mulher”, com letra da cantora, que gravou a música para “fazer um carinho” no ator Carlos Alberto.
- O resto das músicas é de gente que estava comigo, quando comecei. Há pedaços de Silvinha Teles, de Dolores, de Aloysio, de Marisa. Não se trata de um saudosismo burro, de fossa, mas de um estado de espírito.

O lançamento

Para a cantora, esse disco é uma continuação do que gravou em 1962, antes de deixar o Brasil, também com produção de Aloysio de Oliveira. O Lp de 1970 – gravado durante seu show, no Canecão – não é de seu agrado, embora não o renegue.
- Na verdade, não gostei de nada que fiz depois que voltei ao Brasil. A exceção é o disco que vai ser lançado agora. Sei que alguns críticos vão dizer que não acrescenta nada à minha carreira porque gravei músicas antigas, sem a preocupação de agrada a ninguém. Mas o disco soma muita coisa para mim.
O lançamento do Lp de Maysa vai ser no seu apartamento, na próxima semana. A festa reunirá amigos e uns poucos jornalistas, porque o que a cantora quer, agora, é muita paz. Não há shows nem apresentações em rádio ou televisão programados.
- Meu único programa, atualmente, é passar o maior tempo possível na minha casa em Maricá. Só voltarei a ter uma vida artística mais ativa se puder fazer tudo com muita calma. Senão, fico apenas no disco, que está aí para quem quiser ouvir. É o que tenho para dar. 

Revista Veja, 1974.

"Maysa vai cantar as músicas de seu próximo disco" - Diário de Notícias, 6/10/1974.





14 de agosto de 2017

Sofro porque não sou burra - Romance Moderno,1971



A minha verdade – uma entrevista corajosa com Maysa

ROMANCE MODERNO – A novela representa uma outra fase em sua vida?
MAYSA – Possivelmente se abre um campo novo para mim. Espero que seja uma experiência bastante válida para o futuro. Me interessa muito fazê-la.

Quantas vezes você se sentiu obrigada a recomeçar a sua vida?
Eu não creio que tenha recomeçado nada, principalmente no lado profissional. Eu apenas tenho acompanhado as circunstâncias.

Você se projetou como cantora milionária. Hoje você canta para viver ou vive para cantar?
Fazem sempre esta pergunta para mim. A ideia de cantora milionária foi o público quem deu. Acredito que eu seja milionária no sentido de ter boa voz, ter bons amigos. Hoje em dia faço o que gosto: vivo canto, sou atriz, sou jornalista. Estes são os meus ideais, me fazem falta até para respirar. Uma coisa em função da outra.

Você demonstrou em suas composições ser uma mulher que sofre. Sofrimento para você representa uma razão de viver?
As pessoas que hoje em dia não sofrem são muito burras ou muito insensíveis. O sofrimento a gente tem de manhã, de tarde, de noite. A vida está mais cheia de sofrimentos do que de outras coisas. A gente procura, de certa forma, dar mais valor às coisas boas do que ficar pensando em coisas tristes.

Qual a diferença entre a felicidade e o sofrimento?
É justamente a diferença entre uma coisa e a outra.

Você acredita no amor?
Eu acho que é a única coisa que existe de bom no mundo.

Você como cantora se acredita atual ou fora de moda?
Como cantora, sigo a minha linha. E me sinto sempre atualizada. A música é uma só desde que ela começou. Eu faço o que gosto.

Você, que só canta um tipo de música, como vê toda esta renovação?
Eu acho que há muita confusão. Existem grandes valores, como por exemplo, Taiguara. Alguém pode chamar este menino de superado? Inclusive, ele tem a mesma linha que eu. É moderninho, é um garoto desta geração. O próprio Ivan Lins, que é considerado o mais quente do momento, se repararmos nas suas composições, tem um profundo sentido de fossa, de amor. No fundo, é sempre a mesma coisa. O amor a gente sempre sente igual.

Você já esteve na fossa?
Estive, e muitas vezes! Para sair dela há duas formas de encará-la. Ou curti-la muito bem, sofrer por ela, ou partir para um negócio melhor, fugir de gente que não se gosta, da burrice, se ligar com gente que nos faça bem.

Você seria capaz de morrer por alguém?
Totalmente!

Então, a morte compensa como sacrifício de amor?
O amor compensa qualquer coisa.

Como você define a angústia?
Para mim, a coisa mais importante é você tentar dar do que receber. Quando você deseja dar, dizer tudo o que tem dentro de si e não é compreendida, aí , sim, é a pior coisa, a maior angústia.

Entre a angústia e o desespero, onde você vê a solução?
É começar tudo novamente.

Você já sentiu em sua vida um momento de profunda ternura?
Sempre tenho motivos de ternura em minha vida. Sobretudo quando vejo uma possibilidade de diálogo com gente que me entende. Outro dia tive um momento de grande ternura em minha casa, quando estive batendo um papo com uma mulher que considero uma das coisas mais excepcionais que já encontrei em minha vida, Marília Pêra. O de que esta mulher é capaz, com os olhos, com palavras, ou mesmo expressões, é um negócio fantástico. Marília é uma mulher inteligente, sabe o que quer, é sensacional.

Crê em alguma coisa acima de você?
É muito importante eu me considerar importante, pois, acima de mim, existe um amor mais que o meu. E será que existe um amor maior que o meu?

Você andou uma época um pouco afastada, meio sumida. Qual foi a causa real?
Aconteceu que fui para a Espanha. Meu marido é espanhol e tive que acompanha-lo. Lá, continuei inclusive cantando, embora com menos frequência que aqui. Depois estava cansada de algumas fofocas e dei uma paradinha.

Você se considera o tipo de mulher em transição pela liberdade?
Desde que me entendo por gente, luto pela liberdade.

Qual o momento artístico mais importante de sua carreira?
Eu acho que ainda está para vir. Eu quero sempre mais do que já tenho.

O que você acha mais importante na vida?
É o amor. Para carreira, para tudo na vida.

Você agora está dando uma de atriz. Como está se sentindo?
Acho que atriz eu fui a vida inteira. Quem vive é ator; acho que participar da vida como eu, é uma forma de ser atriz. Às vezes, você tem de fazer coisas de que não gosta, atuar com pessoas que você detesta. A vida, toda ela, é um teatro.

O personagem que Bráulio Pedroso criou para você é mais ou menos um retrato de sua vida, mulher desquitada de industrial paulista. Como é a história?
Não tem nada que ver com a minha personalidade e, além do mais, eu não sou desquitada de um industrial paulista. Sou casada com um industrial espanhol e vivo muito feliz.

Você não tem receio de que esta nova carreira venha atrapalhar sua vida de cantora?
Não. Ao contrário, suponho que vai somar mais uma coisa à minha vida.

Se você tivesse que decidir entre ser cantora e atriz, optaria por qual?
Acho que este negócio de opção é muito tolo. Se tivesse que fazer as duas coisas ao mesmo tempo, sim. Eu não vejo porque tenha que deixar uma coisa pela outra.





(Entrevista publicada originalmente na revista Romance Moderno, nº 38, em 1971.)

18 de abril de 2017

Maysa, outra vez rica e caprichosa - Intervalo 2000, 31/07/1972



Pela segunda vez, Maysa interpreta mulher rica e caprichosa na televisão

São Paulo, Maysa (35 anos) atualmente está interpretando o papel de Márica, uma mulher rica e caprichosa, na novela "Bel-Ami", da Rede Tupi de Televisão, esta é sua segunda experiência como atriz de TV. Antes, fez Simone em "O Cafona" e, como desta vez, era rica. No tempo em que as músicas de "fossa" faziam grande sucesso, Maysa apareceu como cantora e compositora. "Ouça" foi uma de suas composições famosas. Depois, mudou-se para a Espanha, afastando-se um pouco da vida artística .
Depois de "O Cafona", Maysa foi para o teatro, onde interpretou a peça "Woyzeck" de Büchner. Embora fosse uma estreante, a crítica foi implacável quanto a seu desempenho como a camponesa Maria.
Enquanto faz novela, Maysa se apresenta no Bierklause do Rio, cantando, e prepara um show para os paulistas: "Tem que ser um grande show para marcar minha volta a São Paulo, depois de tanto tempo longe dos paulistas".





(Reportagem publicada originalmente na revista Intervalo 2000 de 31 de julho de 1972. Agradecimentos ao blog Astros em Revista)


18 de novembro de 2016

Televisão: Maysa em Maricá (1974)


Maysa em Maricá




Em 1987, a TVE Brasil exibiu um especial em homenagem à Maysa com imagens editadas do precioso programa dirigido por Liana da Rocha para a emissora em 1974 e gravado nas localidades de Maricá, onde Maysa morava naquela época. No programa aparece a casa de praia da cantora, enquanto ela dublava seus antigos sucessos, relembrava sua trajetória artística e respondia perguntas de Antônio Carlos Jobim, o diretor de televisão Carlos Alberto Loffler, o pianista Ribamar,  o cronista Mister Eco, Roberto Menescal, Luiz Eça e Aloísio de Oliveira. Este documentário é raríssimo porque jamais foi reexibido novamente na íntegra.


parte 1

parte 2

parte 3

parte 4

parte 5

parte 6



18 de maio de 2015

Imprensa: O que? Qualquer coisa. - Revista Veja, 09/09/1970


O que? Qualquer coisa.


Sobre a envelhecida – mas não esquecida – figura da mulher infeliz, a cantora Maysa vem desenhando nos últimos três meses o perfil ainda indefinido da pessoa famosa que se decide a correr o risco de mudar de atividade e sofrer críticas como qualquer principiante. Entrevistadora, apresentadora e repórter do DIA D (Record de São Paulo), ela tem mostrado inteligência, presença de espírito e, ao contrário da maioria dos apresentadores de TV, cultura. Mas não tem evitado os erros que todo principiante comete. O mais recente deles foi uma confusa entrevista nos EUA com o advogado do fanático Charles Manson, acusado de em agosto do ano passado ter comandado o assassinato da atriz Sharon Tate. Esse erro, seus novos planos e seu passado foram alguns assuntos de que falou na entrevista com Armando Salem, editor de “Televisão” de VEJA:

VEJA – Diga alguma coisa.
MAYSA – Ahn? Bemm... Eu posso dizer o que você quiser. Mas você não tem uma pergunta específica?
VEJA – Qualquer coisa.
MAYSA – Bom, tá perfeito, mas eu preferia que você dissesse sobre o que. Você é jornalista há muito tempo? Digo, faz tempo que você é repórter de VEJA? Você é repórter de VEJA?
VEJA – Sim, sou repórter de VEJA, faz tempo que sou jornalista e entendo sua preocupação. Não sou um foca*. Agora, não entendo seu espanto com minha pergunta. Afinal de contas, foi uma pergunta exatamente do gênero da que você fez ao advogado de Charles Manson no Hall of Justice, de Los Angeles. E com a mesma insistência.
MAYSA – (silêncio perplexo)
VEJA – Você deve assistir aos vídeos tape de seus programas e se tiver o mínimo de senso crítico...
MAYSA – Sim, vi o tape no Rio de Janeiro logo que cheguei de viagem e tive vontade de morrer. Se pudesse desligar o botão da minha televisão e tirar o programa do ar, teria tirado. Infelizmente, a gente não viaja por conta própria, mas com o dinheiro dos outros. E o programa que dá IBOPE, não importa se bom ou ruim, eles levam ao ar. A TV brasileira não existe para ser muito inteligente.
VEJA – Nesse caso a coisa muda de figura, não conhecia você pessoalmente e pela TV você parecia ser uma mulher orgulhosa e pretensiosa que...
MAYSA – Eu, orgulhosa? Porque?
VEJA – Talvez pelo seu porte, pelo ar teatral da pose sempre estudada...
MAYSA – Mas eu não sou estudada. Sou autêntica. Procuro sempre agir com naturalidade, a não ser...
VEJA – Não vem ao caso. Isso fica para mais tarde. O negócio é discutir sua entrevista com o advogado de Manson. Você conseguiu com exclusividade a cobertura do julgamento. Teve o advogado à sua disposição, o auxiliar do xerife, uma amiga de Manson e não fez nada. Deixou todo mundo sem saber nem mesmo se Manson estava na sala do tribunal. E, o que é pior, depois de um raio de luz, da insistência do advogado em que você fizesse uma pergunta específica, perguntou se ele achava Manson culpado.
MAYSA – Não sei o que aconteceu. Sabe quando você sonha que está fazendo algum troço, e quando está ali, com tudo à sua disposição, vem alguma coisa e lhe tolhe todos os movimentos? Minha voz não saía. Eu não conseguia coordenar nenhum pensamento. Sei lá, estava abobada. Se eu tivesse me preparado, teria feito uma coisa melhor, mas fui avisada às 10 horas da noite, pelo auxiliar do xerife, de que poderia ir ao Hall of Justice, inclusive com a câmera de filmagem.
VEJA – Sabe o que é uma pauta?
MAYSA – Sei, é aquele resumo da história que a gente faz...
VEJA – Não. Esse resumo também é importante e você não fez...
MAYSA – Não vai querer que eu lhe mostre que conheço o caso Manson?
VEJA – Claro que não. Mas no programa você devia ter lembrado o caso. No entanto, partiu do pressuposto de que todos os seus telespectadores eram gente que acompanha as notícias através de jornais ou revistas...
MAYSA – Meu público é o público de “Ouça”, ou seja, de todas as classes.
VEJA – Mas voltemos à pauta. Pauta é exatamente este roteiro que eu trouxe para me orientar e não esquecer certos temas da entrevista que estamos tentando fazer. Coisa que pouquíssima gente parece conhecer em nossas televisões.
MAYSA – Concordo plenamente, tudo é improviso. Mesmo nas entrevistas cara a cara que eu faço no “Dia D”, muitas vezes, fico sabendo cinco minutos antes de entrar em cena, ou do encontro com o entrevistado, de quem e do que se trata. Não é que eu queira me desculpar, mas o resultado só pode ser o apresentado – às vezes; bom, outras, ruim. Mas acho importante o que está dizendo...
VEJA – O que?
MAYSA – Todas essas críticas. Ainda no domingo passado, a respeito do programa do Charles Manson, li em um jornal de São Paulo que o programa havia sido excelente, com mínimas falhas. Agora veja quanto foi ridículo. Para mim isso é que é o importante, sei que não sou uma repórter...
VEJA – Era minha próxima pergunta. Olhe aqui na pauta.
MAYSA – (Sorri.) Eh, facilita. Mas, dizia, não sou repórter. Vejo no jornalismo algo de fascinante e pretendo me dedicar a ele. Manson era a minha primeira grande experiência, falhei, não pretendo me desculpar. Mas não gosto das coisas pela metade, como fazia antigamente. Ninguém nasceu sabendo, vou aprender a ser jornalista, aproveitar o meu “background” – intuição. Tudo em mim é intuição.
VEJA – Desculpe. Mas você parece ser uma mulher culta. Não apenas impressiona por falar fácil, mas suas histórias demonstram uma mulher vivida.
MAYSA – Minhas histórias. Histórias do tempo em que eu bebia demais para ter um pouco de coragem...
VEJA – É tímida?
MAYSA – Ultra tímida. Naquele tempo eu cultivava minha infelicidade. Os jornais falavam que eu era uma bêbada, infeliz, e eu delirava com isso. Ficava feliz porque alguém me incentivava a ser infeliz. Na verdade, eu não era nada, não via nada. Terminei o ginásio e aos dezoito anos de idade estava casada. Jamais gostei muito de ler (li muito pouco). Morei na Espanha, vivi uns meses completamente dura em Paris (mas dura mesmo, não tinha dinheiro nem para comer), morei em alguns países da América Latina e, francamente, não tirei nada além do dia a dia. Claro, aprendi a falar inglês, francês, espanhol e italiano.
VEJA – Bom, vivida ou não, o certo é que você carrega uma boa bagagem. E o simples fato de falar várias línguas já dá para você se comparar com os demais entrevistadores de nossas TVs.
MAYSA – Pra começar, eu quase não vejo televisão e conheço muito pouca gente para me comparar...
VEJA – Você não gosta de televisão?
MAYSA – Para responder isso, tenho que cair no velho chavão: “É masoquismo ver televisão no Brasil”. Mas a verdade é que eu não aguento TV. Ela atrapalha o diálogo e eu adoro conversar. Prefiro bater um papo sozinha, feito uma louca, ou ir cozinhar, a assistir televisão. Além disso, pouquíssimos são os bons programas.
VEJA – O “Dia D” é um bom programa?
MAYSA – Vai ser um bom programa. Já tem muita coisa boa, mas é muito longo e tem uma série de enxertos (musicais, na maioria) que se repetem para encher suas três horas e meia de duração. Agora ele vai passar para uma hora e vinte e será mais de jornalismo do que musical. E existe uma preocupação tanto de minha parte como do Paulinho Machado de Carvalho (diretor da Record) em não assinarmos contrato. Assim, no dia em que um dos dois não estiver satisfeito faço as malas e me mando. Por enquanto estamos de acordo. E animados. Ele com o meu trabalho, eu com as perspectivas de poder fazer um bom jornalismo. Entrevistas humanas, que outros fariam mundo-cão. O velho professor de violino da porta do Municipal do Rio, que, enquanto a orquestra toca no interior do teatro, toca na porta, na rua, feliz, exibindo um cartaz de sua profissão, em busca de alunos. Quero chegar à essência desse ser, dessa vida.
VEJA – Mas você me parece tão epidérmica!
MAYSA – Sim, sou epidérmica. Para mim, tudo é pele. Emoção, o que me cerca. E o que sempre procuro traduzir nos meus programas é isso, o que estou sentindo. Por isso não aceito a imagem de teatral que você me fez na TV. Eu sou aquilo. Por isso tenho fé no filme que só eu e o cinegrafista que me acompanha em minhas entrevistas (Laerte Garcia Rosa) iremos fazer. Sem roteiro. Ele filmará um longa metragem onde eu procurarei viver todas as emoções do momento e tentar transmiti-las. E para tentar transmitir isso vou até o impossível. Não tenho medo de bebidas, tóxicos. Só do LSD. Mas, se for...

* foca é o apelido que se dá nas redações ao jornalista principiante.









  

(Entrevista publicada originalmente na revista VEJA, em 9 de setembro de 1970)

2 de fevereiro de 2015

Televisão: Maysa, com muita saudade - TVE Brasil, 1987

Maysa, com muita saudade

Em 23 de janeiro de 1987, a TVE Brasil (atual TV Brasil), transmitiu o especial Maysa, com muita saudade -  homenageando os 10 anos da morte da cantora, em 22 de janeiro de 1977. Dirigido pelo compositor Fernando Lobo e J.A. Medeiros, era constituído de material de arquivo - compilado do especial gravado pela própria emissora com Maysa em Maricá (1974), o especial Maysa: Estudos (1975) da TV Cultura, e o curta metragem Maysa (1979) dirigido por Jayme Monjardim; tudo isso entrelaçado por textos originais da própria Maysa e outros, escritos especialmente por Fernando Lobo, que logo no início faz uma introdução relembrando os grandes nomes da MPB nascidos e falecidos no mês de janeiro. Além das imagens de Maysa, Jayme, seu filho único, também aparece lhe prestando um depoimento e brincando com seu primogênito (nascido em 1985), e mostrando às câmeras os quadros que a mãe pintou quando viveu em Maricá nos anos 70. A narração é dos atores Cássia Kiss e Raimundo de Souza. Agora, vejam e revejam quantas vezes quiserem Maysa, com muita saudade.




27 de janeiro de 2015

Televisão: Maysa no Dia D - TV Record, 1970


Como já abordado num post aqui no blog, em 1970 Maysa tomou a dianteira do jornalístico Dia D da TV Record de São Paulo, após a saída da então apresentadora Cidinha Campos da emissora, tendo revelado um desempenho excelente como repórter.
Numa de suas reportagens para o programa, Maysa visitou o set de filmagens de A Herança (1970) obscuro filme do cineasta Ozualdo Candeias - pioneiro do chamado cinema marginal -, onde entrevistou um velho conhecido seu, o cantor Agnaldo Rayol, que fazia uma participação no filme. Rodado em Itapecirica da Serra (SP), a trama se baseava em Hamlet de William Shakespeare; transpondo a história para o cenário rural brasileiro. Nas imagens a seguir podemos ver Maysa ao lado de Rayol e do ator David Cardoso, protagonista do filme.














Fotos: fotógrafo não identificado
Acervo: Cinemateca Brasileira



11 de agosto de 2014

Imprensa: Maysa uma gatinha na galeria dos ídolos - Radiolândia, 1957


Maysa uma gatinha na galeria dos ídolos!



Havia no público do Rio incontido desejo de conhecer a jovem cantora e compositora surgida tão surpreendentemente no cenário musical do país – e Maysa Matarazzo, que conquistara S. Paulo da noite para o dia, encontrou o Rio de braços abertos, para a complementação de sua glória – beleza exótica, sua cara lembra a de uma gatinha mesmo – o sucesso enorme do primeiro “Lp” animou a RGE ao segundo, que vem por aí para novos êxitos de vendagem – a noite foi de Maysa na TV-Rio

De OSWALDO MIRANDA
Fotos de WILSON LOPES

Maysa Matarazzo agora também canta para os cariocas, depois de representar para eles, assim como que um enigma... sim – um enigma. A totalidade do público do Rio só conhecia Maysa de sua fama obtida fulminantemente, com o lançamento de um “long-playing”. Ela começava por onde os outros terminam. O LP é o ápice da carreira de todo cantor de rádio e muitos, de comprovada categoria e popularidade ou tradição artística, ainda não o conseguiram. E seria inoportuno, até, referi-los neste escrito que focaliza um valor absolutamente novo, um nome incipiente na arte da composição e do canto populares.
Eu disse que Maysa era um enigma para os cariocas. Sim. Eles a viam em fotografias, liam as reportagens, procuravam seu disco nas lojas, mas já desde há algum tempo davam mostras de um desejo incontido de conhecer, em pessoa, aquela que tão sensacionalmente surgira no mundo musical do Brasil, legendada, primeiro, pelo sobrenome famoso que logo evoca uma alta expressão na sociedade e na indústria nacionais; segundo, pelo valor incontestável que demonstrou possuir.
Um dia Maysa viera ao Rio, cantara na Mayrink Veiga, dera um giro pelas emissoras, mas tudo foi uma andança a jato, na companhia de Valter Silva. Logo voltava a São Paulo e em seguida se conhecia a notícia de que fora contratada pela rádio e televisão Record. Tal contrato, como o que assinara com a RGE, a instâncias de Roberto Côrte Real, Maysa só o fizera mediante a condição primacial de atuar, na qualidade de profissional, com o dinheiro proveniente de seu trabalho revertendo, na mor parte, em favor dos necessitados, em favor dos cancerosos.
Maysa passou a ser notícia de jornal e a cada dia crescia sua popularidade e aumentava, no Rio, a angústia de um público que ansiava por conhecer a grata revelação artística do ano de 1956.
O enigma, finalmente de desfez. Maysa aceitou contrato de Bom Bril para fazer uma temporada na TV-Rio. E veio; veio para começar no Rio a mesma brilhante carreira já consolidada em São Paulo. Sua vinda coincidiu com a instalação dos escritórios da RGE no Rio. Não será preciso dizer, portanto, que um mundo de gente da terra da garoa (ainda é?) voou do planalto para festejar com Maysa a noite de sua estreia. Primeiro, foi um “cock-tail” na Mesbla, com taças se chocando no ar e às vezes até se quebrando, tal entusiasmo que imperava no ambiente amigo, de confraternização artística, com o Ibirapuera abraçando o Maracanã e a Avenida São João se dando de braços com a Avenida Rio Branco... uma hora depois toda aquela gente alegre enchia o auditório da TV-Rio, florido para a noite de Maysa. noite memorável porque dezenas de milhares de pessoas, que tanto desejavam conhecer Maysa, com ela travaram contato, tiveram-na assim, com a cara de gata dentro de sua casa, cantando com a voz quente e ingênua, doce e insinuante, que já fizera o encanto dos paulistas.

Léo Batista foi o felizardo da apresentação, contou a história curiosa do surgimento de Maysa, tal como está escrita na contracapa do “long-playing” “Convite para ouvir Maysa”, em redação brilhante de Roberto Côrte Real, e disse o que poucos sabiam: ela é carioca!
A orquestra de Osvaldo Borba, de violinos em surdina, fez os acompanhamentos e o público foi-se embriagando com “Tarde triste”, “O que?”, “Escuta Noel” e “Ouça”, tudo de autoria da própria cantora, e “Segredo” de Fernando César. Violinos e harpas compunham o todo orquestral que amparava a voz gostosa de Maysa, no seu recital, e sua beleza exótica – repito que Maysa parece uma gatinha de estimação e vou até mais longe, sugerindo que sua beleza seja assim uma beleza felina... – a todos encantava.

A noite carioca era toda de Maysa. Para ela eram as atenções, os olhares, os comentários de um milhão de cariocas; para ela eram as palmas da plateia; para ela era o champagne que escorreria no auditório da TV-Rio, o mesmo champagne que marca sempre os grandes acontecimentos.
De vestido preto, com bordados de pedras, Maysa trazia o cabelo louro despenteado e caído por sobre a fronte. Mas o despenteado de Maysa completa o exotismo de sua beleza e compõe, com os olhos verdes, puxados para o canto, em forma de losango, o toque felino a que já me referi.

Quando cumprimentei Maysa, disse-lhe:
-         Você ficará zangada se eu disser que você tem uma carinha linda de gata?
Maysa só fez sorrir e disse:
-         Sabe que eu até gosto de ser comparada a uma gatinha?

É essa simpatia, esse valor, essa esplêndida revelação da música popular do Brasil que hoje todos festejamos. Maysa venceu porque tinha mesmo de vencer. Não fez porque. Venceu naturalmente, pela lógica das coisas. Seu disco que traz o samba “Ouça” já vendera mais de 30 mil exemplares quando escrevo estas linhas e o LP continua descendo das prateleiras, para a alegria de José Scatena e de toda a gente boa da RGE.
Agora vem outro “long-playing” por aí. Na face “A” vocês encontrarão “Ouça”, “O que?”, “Escuta Noel” e “Segredo” e na face “B”, “To the ends of the earth”, “Franqueza”, “Um jour tu verras” e “Se todos fossem iguais a você”. As orquestrações, à exceção de “Segredo”, que é de Henrique Simonetti, são do mesmo Rafael Puglieli, autor de todos os primorosos arranjos do primeiro LP. Será também sucesso.
Quando esta reportagem sair, já Maysa terá feito três ou quatro programas na TV-Rio e os cariocas já terão incorporado a gatinha à galeria de seus ídolos do canto popular. Não sou de dar palpites, mas este eu arrisco, sem receio de errar.


(Reportagem publicada originalmente na revista RADIOLÂNDIA, 1957)