Maysa confessa: "Eu Canto o meu estado d'alma"
A prestigiada revista O Cruzeiro, foi responsável por levar Maysa ás bancas de todo o país, na edição de 25 de Janeiro de 1958. A capa trazia uma estonteante foto do rosto de Maysa, em close, captada pelas lentes do fotógrafo Indalécio Wanderley. Acima da seguinte manchete – Maysa confessa: “Eu canto o meu estado d’alma. A reportagem, de Álvares da Silva, fora feita numa época em que Maysa já havia se desquitado, e sua popularidade alcançava níveis cada vez mais altos. Não eram bem, confissões. O texto dava conta de sua meteórica carreira, e era pontuado por frases soltas de Maysa, dando conta do seu presente, do surgimento da cantora e compositora e de preferências pessoais. Com direito a foto colorida de página inteira, Maysa aparecia em lindas fotos agarrada ao inseparável violão. No fim, declarava: “Eu quero ter apenas meus 21 anos, e ser alguém. É muito importante viver”.
Agora, o Blog Oficial Maysa traz a vocês, a reportagem e fotos na íntegra, com exclusividade. Boa leitura!
Confissões de Maysa: "Eu canto meu estado d'alma"
Bisneta de um barão do império, exposa (ex) de um famoso industrial, torna-se estrela de primeira grandeza
Era moça de prendas domésticas, educada em colégio de freiras, filha de um fiscal do imposto de consumo e esposa (agora ex) de um industrial paulista de nome famoso – mas, como artista, desconhecida. Compositora e cantora, fez fama em 8 meses de atuação, nas TVs e nas rádios de São Paulo e Rio de Janeiro. Sim, é verdade: não há notícia, no movimentado, oscilante e enganador domínio da música popular, de um aparecimento tão fulgurante e de uma consagração tão rápida, como é o caso da singular e talentosa Maysa Matarazzo – a MMM da TV, revelação em um LP de 1956 e uma das melhores cantoras de TV e rádio de 1957.
- escute, D. Maysa, conte-me sua história artística.
- “Escute, não: ouça”, diz ela (em aparte muito vivo, porque seu maior sucesso, na qualidade de cantora e intérprete, é justamente “Ouça”). E relata: “Eu componho desde os 12 anos. No colégio, se a freira se descuidava na aula de matemática, eu musicava um samba. Mas só em 1956, isto é, com 20 anos e casada, durante uma reunião na casa dos Monjardins, meus pais, no bairro da Consolação, em São Paulo, é que o Sr. Roberto Côrte-Real , diretor artístico da RGE, me ouviu cantar e fez convite para gravar um LP. Esse LP permaneceu quase ignorado, até que em 13-04-1957 eu resolvi cantar na Rádio e TV Record. Meu pai não queria, dizendo que uma Monjardim não poderia jamais ser cantora popular. A família Matarazzo idem”. Fiz sucesso. Gravei um 2º LP, e vem por aí um 3º. Tenho mais de 40 canções, mas por enquanto, só 17 na praça. Eu quero compor, cantar e representar”.
Eis as confissões de Maysa Matarazzo:
- “Maysa, nome incomum, é um cripto de Maria Luísa enfeitado com um Y. O nome me foi dado por minha mãe em homenagem a uma grande amiga. Todo mundo pensa que eu sou paulista. Vivi muitos anos em São Paulo, estudei no Sacré Coeur de Marie de São Paulo, meus mais moram lá, mas eu nasci em Botafogo, à Rua Visconde e Silva. Numa casa que ficava em frente à residência de Simoens da Silva. Eu acho que estive 10 anos interna estudando. Repeti a 2ª série para que me tirassem. E agora sonho quase toda noite que vou voltar para o colégio interno.”
- “Meu pai chama-se Alcebíades Guaraná Monjardim, fiscal com atividade ali pela Rua 25 de Março de São Paulo. Ele é o neto mais velho do Barão de Monjardim do Espírito Santo.”
- “Minha mãe chama-se Inah Figueira Monjardim. É um amor.”
- “Eu tenho só um irmão, com o mesmo nome de meu pai, Alcebíades. Está com 16 anos. Toca só campainha, por enquanto, mas tem um ritmo louco.”
- “Aprendi a tocar violão com 14 anos. Sílvio Caldas me ensinou.”
- “Saí do colégio para casar com André Matarazzo. Ele me conhecia desde quando eu era uma guria de 5 anos. Mas um dia, durante umas férias em Poços de Caldas, eu estava montada num burrico passeando, e meu pai me apresentou a ele. André puxou as minhas tranças. A partir desse encontro, fiquei gostando dele. Eu tinha 12 anos.”
- “Gostou muito do meu sogro, o conde Andrea Matarazzo, e também de minha sogra, D. Amália Ferreira Matarazzo. Todas as minhas composições são dedicas a André. Casamos, mas não deu certo.”
- “Elizete Cardoso é uma fábula. Eu fico complexada quando a ouço cantar. Faço questão de dizer: Elizete Cardoso é a maior cantora do Brasil. Ainda não fez sucesso espetacular porque é muito tímida.”
- “O maior cantor é Sílvio Caldas. Aprecio Caymmi e Billy Blanco. Admiro Antônio Carlos Jobim (Tom, autor do famoso sambalada “Se Todos Fossem Iguais a Você”, de parceria com Vinicius de Moraes). Aliás (e Maysa imita a voz de Ema d’Ávila), esse negócio de música popular é muito sério.”
- “O que eu quero é andar de bicicleta, ir ao parque de diversões, comprar picolé. Até 5 anos atrás, eu só sabia rir. Agora, não sei o que é dar uma risada com gosto. Eu devia ter nascido homem, e preto.”
- “Tudo isso que eu canto, não é propriamente Samba-Canção nem bolero: é estado d’alma”; acentua com ênfase MMM. “O importante é cantar e exprimir alguma coisa. Há quem canta bonito, mas não dá pé.”
- “Minha primeira composição, eu a fiz quando tinha 12 anos. É “Adeus”, que está no meu primeiro LP. Depois que passei a morar no Rio, quando acabo uma canção, canto pelo telefone interurbano, para meu pai e minha mãe, em São Paulo, e peço a opinião deles.”
- “O nº 13 tem me dado sorte. Meu 1º LP é 0013.”
- “Eu fazia poemas quando estava interna no Sacré Coeur. Muitas dessas poesias ainda não foram musicadas.”
- “Tenho loucura por teatro. Gosto de papel dramático, detesto comédia, adoro supra-realismo. E mais: gostaria de trabalhar numa peça de Abílio Pereira de Almeida.”
- “Em junho de 1957, eu vim ao Rio fazer uma “catetuagem” do meu LP. Quase ninguém me conhecia. Alguém no auditório da Rádio Mayrink Veiga me pediu para cantar “Tarde Triste” (composição de MMM). Foi a maior emoção da minha vida. Completamente.”
- “Minha última produção tem um título bem paradoxal: Felicidade Infeliz.”
“Felicidade, vamos fazer um trato
manda ao menos teu retrato
para que eu veja como és.”
- “Já me disseram que, cantando, eu faço propaganda para os Matarazzo.”
- “Eu quero ter 21 anos e ser alguém. É muito importante viver.”
Os mais belos olhos: MMM é moça de 21 anos. Tem um filho. Sendo uma cantora e compositora de grande valor, espanta-se com a fama.