16 de dezembro de 2013

Imprensa: 5 anos sem Elis, 10 anos sem Maysa - Revista Manchete, 1987


5 anos sem Elis, 10 anos sem Maysa


Biografar Elis e Maysa é fácil. Retratar, impossível. De que adianta falar de suas vidas atribuladas até suas mortes trágicas? De que servem dados e datas, se às vezes o destino se faz irritantemente inexplicável? Talentosas, famosas, maravilhosas, elas não conheceram a paz. Se conheceram, foi-lhes dado apenas saborear em alguns momentos. Doces, porém poucos. Duas vidas consumidas em buscas incessantes, em procuras totais. Lutaram até o fim, por tudo. E tudo em ritmo intenso, incessante. Alucinante. Ao longo de suas tumultuadas carreiras tentaram a torturante tarefa de engolir a vida num só gole (no caso de Maysa, on the rocks). Para depois de tudo, de tanto, conseguirem se transformar em mitos musicais maiores. Mas isso é pouco – ou nada – pra quem teve tanta sede. O tempo passa, os mitos morrem, por isso é preciso sacudir a poeira da frágil memória nacional, de vez em quando. Principalmente quando se sabe que está fazendo cinco e dez anos que Elis e Maysa se calaram.

Texto de Renato Sérgio

“Por favor, não deixe ninguém subir. Nem minha mãe, nem meu pai, nem o Samuel e nem Deus!”
Era noite/madrugada do dia 18/19 de janeiro de 1982. Já de manhã o porteiro João Francisco atendeu pelo mesmo interfone. A voz era outra, mas também aflita. Pouco antes do meio-dia, Elis Regina Carvalho Costa dava entrada ao Pronto-Socorro do Hospital das Clínicas de São Paulo, com parada cardio-respiratória, segundo a médica Elizabeth Nicodemo.

 Dos quatro coveiros que fizeram o enterro, Domingos José da Silva, 31 anos, salário mínimo, nunca teve um disco dela. Quando desceu o esquife ao túmulo 2.199 da quadra 7 do setor 5 do cemitério do Morumbi, sepultava um corpo, calava um canto. Era o ponto final de uma carreira turbulenta porém marcante. Uma das maiores estrelas de toda a historia da música popular brasileira. O fim de uma dura caminhada, começada num dia inesquecível – 31 de março de 1964 –, quando ela chegou ao Rio, com o pai e uma carta de apresentação do PTB gaúcho, batalhando um emprego na Cibrazem, já cantora amadora de só aplauso como pagamento por sua incrível voz.

 Entre a carta e o óbito, uma guerra nada santa. Foi dada à luz do palco poucos meses depois da chegada ao Rio – setembro de 64 – no berço (e tumba) da bossa nova, um bar chamado Bottles, numa ruela sem saída da Rua Duvivier, em Copacabana. Cantando como uma deusa. Guerreando como um diabo. Deusa e diabo na terra do som. O canto ficou em algumas – poucas – gravações. A fala, os ventos levaram. Uma: “Tenho o prazer de me danar e me recompor sozinha. Não preciso de muletas.” Teve mil vezes o prazer de se danar e se recompor, pensando que não precisava de muletas. Precisava, sim, e de muitas. Até que uma delas a derrubou.

“Monja, eu te adoro, Monja!”
 Era a tarde/noite do dia 22 de janeiro de 1977. Monja era como Maysa chamava o pai, Alcebíades Monjardim, tomado de um estranho pressentimento naquele sábado, diante de mais uma fase ultracarinhosa da filha. Pediu até que adiasse a viagem para o dia seguinte. Mas ela riu, dizendo que domingo é pior a estrada, por causa do pessoal que volta da região dos lagos para o Rio. Fizeram tudo para ela ficar mais um pouco. Mas ela queria ir embora. Os beijos, o carro, a arrancada. Pouco depois a Brasília azul, placa FJ-5505 de São Paulo, batia contra a mureta central que divide as duas pistas da Ponte Rio-Niterói, pouco antes das seis da tarde. Um choque fortíssimo: o volante entrou até a altura do banco traseiro. Foi socorrida quase imediatamente por dois agentes da Polícia Rodoviária, Augusto César e Orlando Rolim, e levada para o Hospital Antônio Pedro, em Niterói, mas morreu antes de qualquer providência médica possível. O rosto, perfeito, mas as pernas e o braço direito tinham fraturas expostas, além de afundamento do tórax. Maysa seguia, sozinha, para Maricá, no litoral fluminense, onde tinha uma casa de praia, levando utensílios, roupas e alimentos para o fim de semana que passaria com seus cachorros e gatos. Estava de calça jeans, blusa amarelo-claro e botas marrom-escuro. Pouco antes, tinha escrito uma poesia (ou letra de música) que dizia: “Há no ar um imenso desejo de adeus/não há a menor dúvida/não há a menor dúvida”.

 Não havia a menor dúvida.

- “Tenho muitos machucados, pelo corpo inteiro” – ela tinha dito, um dia. Morreu machucada. “Tenho uma profunda necessidade de dizer que amo as pessoas, mas só tenho coragem de fazer isso com a ajuda da bebida.” Bebeu. “E geralmente acabo destruindo aquele amor que estou querendo dar.” Destruiu. “Porque só bêbada assumo essa responsabilidade de relacionamento que não devo ter tido, quando criança.” Não teve. O colégio interno era o certo, no entender familiar. E lá foi ela para o Sacré-Coeur, deixando para trás o casarão da Rua Marquês de São Vicente, em Botafogo, Rio, onde se fartava de brincar, comer manga adocicada pelas mordidas de morcegos. Sentia muita falta da mãe, do perfume que a mãe usava, então pedia que levassem o vidro e derramava no travesseiro, só para sentir o cheiro. 

 Mas da infância também ficou o outro lado, o alegre, das férias em Vitória do Espírito Santo, terra dos parentes paternos, tendo o mar por quintal, comendo banana molhada de água salgada, usando árvore como trampolim.

“As pessoas estão ficando cada vez mais sós, cada vez mais ilhadas.” Ela, mais. Desde os anos – foram oito – de estudo de piano, daqueles vestidos cor-de-rosa que a avó fazia. E ficou, da infância também, o gostinho do licor que roubava do fundo dos copos das visitas, quando iam embora. Paladar fatal. “Ninguém gosta de bêbado!”

 Moça de muitos amores, mulher de muita coragem. Bêbada ou não. Artista de muitos caminhos, se não chegou nem perto do sonho de estudar medicina, não morreu sem concretizar outro sonho, o de ser atriz, duas vezes: em Woyzeck, de Georg Büchner, no palco, em O Cafona, de Bráulio Pedroso, na televisão. Teve uma butique de roupas, discos, livros e objetos usados, em Copacabana, pintou quase 100 quadros a óleo, principalmente entre 1974 e 77, fez esculturas e deixou mais de 200 poesias não divulgadas, além de muitas letras musicais guardadas.

 Uma:
“Eu fui te buscar no mais profundo do meu corpo/te amei antes e te amo agora que já não sei mais/inda outro dia olhei nos teus olhos/e só vi a minha imensa dor/que não era mais a minha.” Muitas rimas, muitos rumos. Todas as certezas que a angústia lhe deu, levaram-na a portos estranhos. “Mas que eu diria quase seguros/que eu não procurei/e vou indo inutilmente/numa busca que não é minha/que não posso/ que não sei.”

 Cessada a busca e calada a voz, restaram-lhe duas missas: uma no pequeno coreto da praça central do bairro Divinéia, em Maricá, com a presença de um maquiador da televisão e alguns veranistas, além do filho, do irmão, uma tia, uma prima, o prefeito, e a promessa de uma rua com seu nome. No sétimo dia, outra na Igreja Santa Margarida Maria, na Lagoa, Rio, com apenas três nomes conhecidos, ligados ao meio. Depois da comunhão, ao som de Ouça – seu maior sucesso –, o sermão:
“Na semana passada Maysa descobriu a resposta para todas as suas procuras e suas angústias, encontrando a paz e a felicidade. Vamos rezar para que ela, junto a Deus, encontre a ressurreição, vamos, principalmente, lembrar sempre da carga de bondade que ela levava em seu coração, vamos orar para que ela tenha passado para a vida eterna, onde não terá mais solidão, choro, sacrifícios ou sofrimentos.”
Assim tenha sido.

“Pisô malandro. Eu não quero esse acorde, quero este!”

 Elis tinha cabeça de músico. E só reclamava do que sabia, sabendo sempre o que queria. Uma das únicas cantoras brasileiras interessadas em onde iria caber um determinado acorde, sacando onde é que ele ia ficar melhor. Malícia e pureza, juntas, na voz. A gente pensava que sabia o que esperar dela, mas sempre pintava surpresa, novidade, o inesperado, enfim. 

 Cantando ou não. Os outros tentando sair da mesmice com uma cortininha atrás e uma luzinha de lado, passando apenas uma emoção pensada, dosada. Elis? Nunca! Elis tinha o grande lance do “eu quero, eu assumo”. Já na época em que a música começava a ficar uma coisa difícil, o coração mais ainda, ela armava mesmo, geral. Até em camarim, com filho pequeno dormindo, psiu, ela pedindo pra todos falarem baixinho pra não acordar, o garoto num canto, a garoto noutro.
Elis era assim.

 E continua vazio, o espaço feito vago por uma cantora que não deixou nada pra ninguém fazer: fez tudo a que tinha direito e até ao que não tinha. Só não cumpriu o papel planejado, capital inicial de sua carreira, que era o de carbono-concorrente de Cely Campello, cercada de rocks, calipsos e variedades outras, num disco chamado Viva a Brotolândia. Dezoito anos depois, dias antes de morrer, acusava as gravadoras de usarem o mesmo expediente, o de fabricar cópias de estilos que deram certo. Acontece que Elis era mais petulante e impertinente do que quem pretendia traçar seus caminhos. Mostrou isso o tempo inteiro, a vida toda, curta, de quase 40 anos.

“A gente faz parte de um grande teatro, cada um tem sempre uma carta escondida na manga. Ainda vou guardar uma dessas para o futuro, que não sou boba nem nada.”

 Pra guardar, deu; só não deu pra usar. Na verdade, poucos patrícios, de qualquer setor, deixaram uma marca tão profunda no inconsciente coletivo brasileiro. E talvez, no campo da música popular, ninguém tenha conseguido tanto, tenha voado tão alto.
“...e quando lavarem a água/digam o gosto pra mim.”
Ainda não lavaram. Pior: sujaram mais.

 E lá se foram cinco anos, depois daquela triste manhã de véspera de feriado, as multidões dizendo que ela tinha morrido e todos ficando sabendo, em comoção nacional, que Elis não era tão antipopular como ela mesma se rotulava.
“Dizem que eu sou a maior cantora brasileira, mas quem vende disco é a bunda da Gretchen!”

 Cada vez se acentua mais sua sentida ausência. Quanto às oscilações estilísticas, remetem-nas ao temperamento decididamente irrequieto, daqueles que não deixam ninguém indiferente. Do tipo ame-a ou deixe-a. Muitos a amaram, muitos continuam amando na saudade, muitos a deixaram, claro.

 Mas ninguém ficou indiferente. Porque ninguém deixou de ser atingido por suas rajadas, musicais ou não. E ninguém, nem nada, foi poupado. Sua exata noção da realidade do mundo artístico em geral, brasileiro em particular, era tão afinada quanto à sua inigualável voz. Nunca quis ser líder e foi, nunca quis ser imortal e é. Sábia, sabia que artista, nesta terra onde até o sabiá canta, só vive de caravanas rolidêi, desde os tempos da Rádio Nacional velha de guerra.

 Pobre daqueles que não viram/ouviram Elis!

 Preocupada com as pessoas: “Isso que está aí não aceito. Mas como acredito profundamente no ser humano, acho que nem tudo está perdido. E vou trabalhar para a melhoria do planeta, a meu jeito. Porque a cada dia que passa acredito mais acredito no grupo, na gargalhada, na leveza, na força do sol atuando em cima das pessoas.” Batalhando pela sua própria tranqüilidade, diante de si mesma e do espelho: “Continuo com os passarinhos, as flores, as cascatas, os rios. Sou uma pessoa antiga, não vou trair minha cabeça.” Vivendo e aprendendo a jogar.

“É mais provável me encontrar na cozinha, fazendo a comida dos meus filhos, do que numa chaise-longue, fazendo cara de Barbra Streisand.”

 Premonição ou não, ela não me pareceu nada feliz, quando me disse essa frase, naquele apartamento alugado da Rua Francisco Otaviano, Posto seis de Copacabana, pousada temporária durante os dias do show Saudade do Brasil. Rita no ombro, Pedro no outro, acrobacias no sofá da sala ensolarada.

 Foi a última vez que vi Elis. Depois de uma reaproximação meio mágica, nos bastidores do Canecão. Depois de 17 anos sem nos falarmos, por desígnio dos deuses e por vacilo de parte a parte. Dizendo-se, basicamente, uma pessoa que adorava viver. Foi a última vez que ouvi Elis.

 Melhor, então, ouvir Manuel Bandeira, poetando: “Cacei imagens delirantes/Maysa podia não gostar/Cassei o poema/muito simplesmente/Maysa não é isso mas Maysa tem aquilo/Maysa não é aquilo mas Maysa tem isso/Os olhos de Maysa são dois não sei que, dois não sei como diga, dois oceanos não-pacíficos.”

 Maysa Figueira Monjardim nasceu carioca, num dia 6 de junho. Gêmeos. Um irmão que tem uma linda filha, chamada Maysa, como ela. “Meus pais são maravilhosos, minha mãe é belíssima e meu pai tem os olhos mais azuis que já vi. Sempre foram meus amigos e companheiros, em tudo e para tudo. Só não gostaram quando comecei a cantar; hoje, porém, são meus fãs incondicionais.” A música sempre importante, desde pequena. A tia Lia era uma pianista excelente e, quando ela estudava, ficava horas e horas sentada ao seu lado. Aos três anos já sabia tocar qualquer coisa, com dois dedos. Ao seis ia dar seu primeiro concerto, mas ficou doente, com sarampo. Aos sete, outra vez, mas com catapora. Assim, nunca pode levar a sério uma carreira de pianista, uma de suas frustrações. “Já casada, esperando Jayminho, meu filho, numa festa em casa toquei algumas de minhas músicas que compunha desde os 13 anos. Estava lá o radialista e produtor fonográfico Roberto Corte-Real, que me convidou para gravar um disco, logo que o baby nascesse.”

 Assim nasceu um long-playing de alta fidelidade intitulado Convite Para Ouvir Maysa. Oito faixas, todas com letras e melodias dela: Marcada, Não Vou Querer, Agonia, Quando Vem a Saudade, Tarde Triste, Resposta, Rindo de Mim, Adeus. Um longa-duração, 33 rpm, inquebrável, microssulco, uma orquídea e um cartão de visitas estampado na capa, embaixo de três letras e quatro números insinuantemente cabalísticos: RLP-0013. na contracapa, o sobrenome de casada, Matarazzo, no rodapé, a recomendação:
 “Dê música, prova de bem querer.”


 Renda do disco revertendo em benefício da Campanha Contra o Câncer. Moça de fino trato, lançada na zorra do mundo da música. Em novembro de 1956 um crítico escrevia que ela tinha despontado como uma espécie de Cinderela às avessas, dispondo-se a descalçar seus sapatinhos de cristal. Gostava de cantar descalça, isso sim. E uma noite ficou descalça em cena, depois de atirar o sapato na mesa da boate liderada por um grã-fino que tinha cometido aquele golezinho a mais que faz qualquer um passar de gente boa a chato de galocha. Cinderela às avessas mesmo, incorporando as frustrações do pessoal que, no fundo, pensava que a felicidade estava só em quem era jovem, rica, bonita, de olhos verdes.

 Essa dark (autêntica) dos anos dourados estaria, hoje, com 50 anos. E agora?
“Agora retiram de mim a cobertura de carne, escorrem todo o sangue, afinam os ossos em fios luminosos. E aí estou, pelo salão, pelas casas, pelas cidades, parecida comigo, um rascunho. Uma forma nebulosa feita de luz e sombra, como uma estrela. Agora eu sou uma estrela!”

 Agora Elis é uma estrela.

 Maysa cinquentona, pode? Pode, mestre Manuel Bandeira?
“Como é, então, que Maysa me comove e me sacode, me buleversa, me hipnotiza? Os olhos e a boca de Maysa se entendem/os olhos dizem uma coisa e a boca de Maysa se condói/se contrai se contorce como a ostra viva em que se pinga uma gota de limão/a boca de Maysa escanteia e os olhos de Maysa ficam sérios/meu Deus, como os olhos de Maysa podem ser sérios e a boca de Maysa pode ser amarga!/Boca da noite (mas de repente alvorece num sorriso infantil inefável)!/Maysa reapareceu depois de longa ausência/Maysa emagreceu/está melhor assim?/nem melhor nem pior./Maysa não é um corpo/Maysa são dois olhos e uma boca/essa é a Maysa da televisão/a Maysa que canta./A outra eu não conheço não/não conheço de todo/mas mando um beijo pra ela.”

 Se a voz de Elis transmitiu tudo ou quase tudo que podia e devia cantar e dizer, se de repente se calou, numa overdose etílico-alcalóide, nada mais a fazer, além de recordá-la:
“O que me abriu o olho foi o lance do Vinícius: o sorriso dele, morto, me deu a sensação de alguém que estava absolutamente satisfeito, porque fizera tudo que podia, tinha vontade e capacidade de fazer. Eu daqui a pouco tenho um enfarte e danço nesta vida, sem fazer nada do que gostaria de ter feito. E a vida não pode ser só isso aqui, não, senão não teria o menor sentido.”

 Ah, o restinho de licor dos copos das visitas, quando elas iam embora! Um gostinho mais tarde transformado em dependência e que fez de Maysa protagonista de histórias mirabolantes, que a fez chegar quase aos 100 quilos, quase desacreditada profissionalmente. Fases de altos e baixos astrais, onde o termômetro, o placar, eram a abstinência integral ou a entrega total. Uma vida ligada à distância que a separava dos copos. E sempre consciente, de tudo e de todos. Até nas contradições. “Só sei que não quero morrer!”

 Mas jamais pensou que as contingências a levassem a toda aquela confusão geral, só querendo se autodestruir. Mania, uma: contrariar todas as normas que lhe impunham. Precisava botar pra fora toda a angústia que sentia naquela gaiola de ouro em que estava metida. E perguntava, coerente: “Pode existir coisa mais besta do que ser feliz?”

 Elis dizia não entender as pessoas e talvez fosse morrer sem entende-las. Por isso não dava pra ficar incomodada. Preferia ser Macunaíma, confessadamente, o herói sem nenhum caráter. Maysa tentou suicídios, sabendo que era uma espécie de apelo, de pedido de proteção. Nos intervalos, períodos de muito carinho pela pele, de muito respeito pelo corpo e a cabeça. Mas preferia ter sido Milena, declaradamente. A amiga de Kafka.

 Almas meio-irmãs, Elis e Maysa morreram juntas: só que separadas por cinco anos menos três dias. E o que é esse tempo todo, diante de tanta eternidade, diante de tanta atualidade?





(Matéria publicada originalmente na REVISTA MANCHETE, em 1987)

18 de novembro de 2013

Imprensa: Maysa, a volta ao lar - Revista Manchete, 1969


Maysa, a volta ao lar 




A experiência e o mundo tornaram tranquila a cantora atormentada, que mais uma vez retorna ao Brasil e ao encontro da sua arte

Reportagem de Creston Portilho · Foto de Wallace Calainho

Quem a vê falar e gesticular sente-se em companhia de outra mulher. Maysa, a dos olhos de gata, que era gorda demais, complicada demais, esta morreu. Os olhos continuam os mesmos, mas a figura mudou tanto quanto a pessoa: está magra e sorridente, sem os gestos nervosos e angustiados do tempo em que cantava Ouça. No apartamento de Copacabana, ao lado do marido espanhol e de recordações do meio mundo que andou percorrendo, ela informa que, finalmente voltou.
-         Voltei mesmo. Tudo aconteceu de repente. Agora que estou aqui só preciso de um repertório novo, porque o meu é absolutamente antigo, o que se pede pelo exterior.

Maysa tem as suas queixas, que desfila sem amargura. Por exemplo: não a mencionam nos textos sobre a bossa nova – “logo eu, que fui quem primeiro levou a bossa nova lá para fora” – e nem a procuraram para novos contratos enquanto morou na Europa – “não sei porque: o público nunca vendeu, sempre que passava aqui pelo Brasil era aplaudida nos espetáculos a que comparecia como espectadora”. De qualquer maneira, a mulher jovem que desprezou um sobrenome famoso para construir o seu cartaz só com o prenome, mantém a mesma sinceridade que lhe valeu a fama de atrevida.
-         Minha voz tem alguma amargura. Talvez porque na canção eu procure uma válvula de escape. Ou talvez porque a canção me ajuda a botar para fora tudo que tenho aqui dentro. A expressão botar para fora é muito feia. Posso substitui-la por outra melhor: vomitar. Vomitar todas as coisas que estão dentro de mim e que saem pelos olhos, pelos dedos e pela boca. É um modo de comunicar, sabe? Por exemplo, tenho muito medo do público, mas canto tão bem numa boate como quando o faço sozinha. Eu gosto de cantar, dá-me prazer.

Por onde andava Maysa? Há pouco tempo atrás, ela andava pelo elegante bairro de Salamanca, em Madri, onde vivia com o advogado e industrial Miguel Azanza, seu marido, e o filho, Jaime. Ai já era uma mulher diferente. Seu vestido curto chamava atenção. Estava magra, bonita, ria mais facilmente. Apenas, fumava demais – “Dizem que o fumo faz perder a memória. Por isso fumo, tentando esquecer certas coisas.” Seus jantares íntimos eram famosos, reunindo desde atores e toureiros a membros da realeza espanhola. Isto durante cinco anos. Antes, passou pelos Estados Unidos, por toda a América do Sul e Central, pelo Japão e pela Europa – Portugal e França. Foi a segunda brasileira – depois de Marlene – a cantar no Olympia de Paris. Cantou no Blue Angel de Nova Iorque e gravou durante dois anos para a CBS. Depois, em Portugal, conheceu Miguel Azanza, casou-se com ele e foi morar em Madri. Em 1963, já casada, gravou dois discos na Itália, inclusive o Barquinho.
-         Este resumo pode parecer que me sinto profissionalmente realizada – diz Maysa. Não há nada disso. Talvez porque ainda seja muito jovem... mas sentimentalmente, sou. Vivo bem com meu marido. Temos nossas brigas, como todas as pessoas de inteligência normal, mas é só.

Agora, de calças compridas e blusa verde, não há nada que faça lembrar aquela mulher atormentada, que uma vez recorreu à sonoterapia para afastar problemas.
-         Quando dizem que eu sou a voz do amor, não sei o que querem dizer. Procuro o amor que sinto, que canto. Nem uma palavra, nem um gesto deixam de ter significado para mim, e nunca foi de outra maneira. Dizem também que eu me exprimo melhor nas canções tristes. Talvez tenham razão. São as que mais chegam a mim. Eu acho que sou triste e não vejo porque havia de ser alegre. Foi sempre assim desde os onze anos, quando eu compunha umas bobagenzinhas. Aliás, não consigo me lembrar muito bem da minha juventude, dos tempos que passaram entre os doze anos e até a bem pouco. Mas me lembro bem dos detalhes de quando tinha três ou quatro anos. – dos móveis da minha casa, do telefone e de todas as coisas pequenas que eu conservo bem vivas. Por isso imagino que minha infância deve ter sido agradável. Talvez, só a infância. Agora luto para me encontrar. Toda mulher que tem uma certa vivência luta sempre por alguma coisa. Quer sempre mais e quando digo que luto para me encontrar, não quero dizer encontrar-me sempre. Isso seria aborrecido. Gostaria apenas de poder dizer, um dia: sou assim. Mas não sei como sou.

Quase ninguém se lembra de que o primeiro disco de Maysa foi gravado em benefício de casas de caridade – era essa a condição imposta pelo seu marido, André Matarazzo. Todos se recordam, no entanto, dos sucessos que começaram a se acumular quando ela se apaixonou pela nova carreira, tornando-se apenas Maysa: Ouça, Meu Mundo Caiu, Se Todos Fossem Iguais a Você, Recado. A última vez que lançou música nova foi no I Festival Internacional da Canção, Dia das Rosas, muito mais aplaudida pelo público do que a primeira colocada. É por tudo isso que Maysa tem confiança nesta sua volta, que se faz um tanto cautelosamente; primeiro ela integrará um júri de televisão, em programa normal; depois chegará a vez de voltar à luz dos holofotes.
-         Olha, a bossa nova, que é o meu gênero, não é o gênero de música que apreciam no Brasil de agora – diz ela. No momento, o pessoal gosta muito de iê-iê. Minha maior alegria no exterior foi ver os estrangeiros apreciando tudo aquilo que o nosso grande público não aprecia.

Dos compositores atuais, gosta muito de Chico Buarque – pretende gravar alguma coisa dele –, gosta de várias coisas, como Eu e a Brisa, de Johnny Alf, mas gostaria muito mais de voltar a compor.
Tenho trabalhado tanto, conhecido tanta gente, que me falta tempo para compor. Só tenho feito poesia. Talvez, algum dia, junte todas e publique. Dá um livro.


(Reportagem publicada originalmente na REVISTA MANCHETE, em 1969)

12 de novembro de 2013

Imprensa: Maysa, o valor da interpretação - Jornal do Brasil, 01/1972


Maysa, o valor da interpretação


Depois de uma experiência em telenovela e o trabalho como atriz de teatro em Woyzeck, de Georg Buchner, Maysa volta à noite como cantora, levando ao público do Number One, em Ipanema, não só o passado e a fossa de Ouça e Dindi, mas também o ritmo e a vibração de Vera Cruz e Adeus América.
A partir de uma lista inicial de 30 números, Maysa selecionou uma dúzia para apresentar no show – uma escolha cuidadosa e preocupada, como tem sido toda a preparação do show desde que surgiu a ideia de faze-lo.
-         Seu forte é a interpretação. – diz Osmar Milito, que a acompanha no show – por isso as músicas já conhecidas não perdem o valor; ganham  uma nova qualidade.

Recado musical

Vestida de preto, cabelos revoltos, Maysa estreia nervosa. Limitada a pouco espaço por uma casa repleta (com muita gente do lado de fora sem poder entrar), ela começa com Tardes, de Milton Nascimento, e, aos poucos, vai ficando mais à vontade com o público. Tom Jobim, Caetano Veloso, Aloysio de Oliveira são os compositores que se seguem. É só música, nada de conversa. “Decorei umas coisas aí, mas prefiro deixar o recado só na música.”

E o recado musical tem a ajuda de Osmar Milito e seu conjunto, Quarteto Forma, e ainda uma percussionista que captava a atenção do público – Naíla Graça Melo, mulher do maestro. É um público exigente e crítico – se não a partir de padrões estéticos bem fundamentados, pelo menos em relação a seu gosto musical particular. É um teste rigoroso para uma artista que se considera tímida, mas que tem procurado enfrentar essa limitação.

Quando voltou da Europa, depois de quase cinco anos fora, Maysa já aparecia como uma pessoa em transformação. Sua temporada no Canecão, onde deveria enfrentar o desafio de uma plateia tão heterogênea, já era um principio. E ela teve de descobrir dentro dela mesma a coragem de enfrentar sua timidez. Coragem que utiliza para enfrentar o público do Number One. 


(Reportagem publicada originalmente no JORNAL DO BRASIL, em janeiro de 1972)


4 de novembro de 2013

Imprensa: Maysa abafou em Nova Iorque - Diário da Noite, 10/11/1960


Maysa abafou em Nova Iorque


NOVA YORK, 9 – (De Waldo Pinto, via Varig, especial para o DN) – Maysa recebeu uma estrondosa ovação, na noite de ontem, do público americano que lotava o “The Blue Angel”, um dos maiores “night-clubs” de Nova York, fazendo-a bisar duas vezes a canção “Ouça”, com quem encerrava seu “show”, cantando em português.

· ADERIRAM

Esquecendo-se um pouco das eleições, os ianques aderiram á nossa música popular e saíram cantarolando os sambas “bossa nova” do repertório da brasileira, que está enviando sua coluna no DN diretamente de Nova Iorque. A crítica nova-iorquina não poupa elogios à intérprete, referindo-se aos seus olhos grandes e tristes (“que constituem um espetáculo à parte”), à nostalgia que se desprende de suas canções e às “suas magníficas composições”.

· CONTRATO CARO

Maysa conta com três anos de contrato, e recebe o maior “cachet” que o “Blue Angel” já pagou a qualquer artista, devendo lá apresentar-se ainda por mais três semanas. As propostas já estão chovendo, principalmente para uma temporada em Las Vegas, onde seria a segunda cantora brasileira a apresentar-se na “cidade do pano verde”. A outra é Leny Eversong, que lhe telegrafou, transmitindo um convite de um hotel.

· “SOCIETY” APLAUDE

O “high-society” norte-americano também não tem se omitido em elogiar Maysa. Foi convidada para apresentar-se em duas noites musicais, em benefício de instituições de caridade. Os brasileiros em Nova York não têm perdido uma só de suas exibições: ainda ontem pudemos registrar, entre os presentes, o Cônsul Geral do Brasil, ministro e sra. Dora A. Vasconcellos, o diplomata Berenguer Cesar, embaixador Jayme de Barros e muitas outras personalidades.


(Reportagem publicada originalmente no DIÁRIO DA NOITE, em 10 de novembro de 1960)

28 de outubro de 2013

Imprensa: Maysa estreia no Blue Angel - Diário da Noite, 31/10/1960


Maysa estreia no Blue Angel


NOVA IORQUE, 31, (de João Rezende, pelo telefone) – As colunas especializadas dos jornais nova-iorquinos abrem espaço, hoje, para noticiar a estreia, logo mais, na boate “Blue Angel” da cantora brasileira Maysa Matarazzo. Há grande expectativa entre o público: mesas foram reservadas por antecipação e a boate, horas antes da estreia da nossa cantora está com a lotação esgotada.

Nos seus comentários sobre o “debut” de Maysa, os colunistas se referem ao seu jeito manso de cantar, aos seus olhos grandes e tristes, à nostalgia que se desprende de suas canções – e salientam que este será um espetáculo diferente dos que costumam apresentar aqui, artistas brasileiros.

Não se trata de puro exotismo, de balangandãs, e chapéus enfeitados com bananas – mas de uma cantora de fama internacional, dentro do estilo norte-americano mas nem por isso sem perder as suas qualidades brasileiras. “Teremos o outro lado do samba, o samba triste” – dizem as colunas.

ESTÁ COM TUDO

Ao chegar a Nova York muito bem disposta, Maysa foi surpreendida com a longa programação que lhe reservaram. Seu contrato que era de três meses, já se estende por oito e provavelmente será cumprido também um giro pelas principais capitais da Europa.

A cantora “associada” e colunista do DN desembarcou de um avião das Aerolíneas Argentinas. Estavam a espera vários membros da colônia brasileira, que logo mais estarão no Blue Angel. 


(Reportagem publicada originalmente no DIÁRIO DA NOITE, em 31 de outubro de 1960)

20 de outubro de 2013

Imprensa: Um ano sem Maysa - Revista Manchete, 1978


Um ano sem Maysa



Uma jornalista uruguaia recorda momentos de ternura e angústia da cantora de Ouça. E fala da sua última carta, recebida no dia do desastre que a matou

Texto de Sara Tinsky · Fotos MANCHETE

“Não quero morrer. Apesar de tudo, eu gosto da vida”, disse Maysa, em sua última entrevista para a TV, em janeiro de 1977, dias antes de se despedaçar com seu carro num desastre. Viajava sozinha para seu refúgio na praia de Ponta Negra, em Maricá, RJ. Levava no carro uns discos de Frank Sinatra e Chico Buarque e sua esperança de recomeçar tudo. Havia escrito: “Vou ser avó exatamente quando desejo ser mãe de novo. Terei amadurecido aos 40?”
Pelo menos, parecia ter acabado de se construir e fixar raízes no chão, deixando de ser aquela mulher que eu conheci em Punta Del Leste, imensa, toda de negro, só olhos (“dois oceanos não pacíficos”, segundo Manoel Bandeira). Em 1961, voltando ao Uruguai, ela acabou por descobrir que eu a seguia – como se segue um mito –, ouvia todas as suas audições e era autora de uma carta tão carinhosa que se tornara ríspida. Caiu nos meus braços no estúdio de televisão: “Só sou amarga quando noto a falta de afeto. Se encontro o carinho, como ousaria ser agressiva?”
No fim das suas apresentações, Maysa gostava de dizer: “Parei de cantar, para continuar vivendo.” E apesar de não conseguir ser livre, de lutar contra tudo e principalmente contra si mesma – “De 58 a 63 minha vida foi um pileque só” –, esforçava-se para só cantar o que queria. Tinha coragem de acreditar no sofrimento e, se fosse necessário, de preferi-lo ao tédio. “Sempre sofri e continuo sofrendo. Mas agora aprendi o valor de cada coisa.”
Seus inimigos a acusavam de viver entregue à autopiedade. De procurar em seus seguidos romances após o casamento fracassado um homem que não existia, um ser mitológico, um escudo contra a gordura, a feiúra imaginária e a sede avassaladora. Mas foi ela mesma quem declarou: “A mulher livre, quando ama, só usa a sua liberdade para defender o amor.” Era tão desassombrada que parecia desaforada. Atreveu-se a se apresentar na Europa para público tão exigente quanto o do Olympia. Teve coragem de ser jurada de programa de televisão, de gravar com jovens, de subir ao palco carioca usando uma capa de vison quando o vison significava o passado Matarazzo – e personagens desse passado estavam na plateia, com diamantes verdadeiros e senso crítico talvez falso. Prontos para julga-la. Ela saiu, coberta de flores.
Quando um dos seus discos foi lançado, em 1974, ela me mandou dois exemplares para o Uruguai. Temia que um deles se quebrasse e tinha essas crises de delicadeza: “Se um deles se perder, você fica com o outro.”
Nesse disco estava o arrastado e doente Você Abusou. Maysa achava que o cantava com toda a sua hipersensibilidade, “a sensibilidade da fera que não é bela”. Para ela, belos eram os outros: Miguel a quem amou, o filho Jayme para quem cantava Dindi e até Carlos Alberto, com quem partilhou seu último esconderijo, a casa branca de Ponta Negra, diante do mar aberto. Em 1975, nós nos encontramos outra vez e Maysa parecia ter vencido definitivamente a bebida e a gordura.
Começou logo a me dar notícias e ordens, sorria, mudava de humor a cada 10 minutos, falava de suas poesias inéditas, estava decidida a trabalhar em telenovela, em teatro, em tudo. E, um tanto pateticamente, me recomendou: “Cuidado para ninguém parar no bar.”
Realmente os fantasmas de Maysa eram compulsivos. Por isso é que, em cada uma de suas canções, ela parecia defender a própria vida. Quando estendia a mão, dava a ideia de se atirar inteira em busca do apoio tão difícil. Um pouco como na letra daquela canção que ela cantava: “Vai lembrar de alguém/Que só carinho pediu/E você fez questão de não dar/Fez questão de negar”...
Maysa me mandou sua última carta em 16 de dezembro de 1976. Por coincidência só me chegou no dia 22 de janeiro de 77, quase na hora em que, rumo a Maricá, ela começava sua última viagem.




(Matéria publicada originalmente na Revista MANCHETE, em 1978)

7 de outubro de 2013

Imprensa: Maysa Matarazzo recebe - Radiolândia, 1957


Maysa Matarazzo recebe




Fotos de HILDO PASSOS

Um simpático cocktail em homenagem a RADIOLÂNDIA representada pelo Sr. Leônidas Bastos e pela equipe paulista desta revista – a cantora vai gravar músicas de outros compositores – confissão feita com muita simplicidade: – “Cantar, para mim, faz parte do ar que respiro!”

Na penumbra do elegante apartamento da rua Rego Freitas, residência do casal Alcebíades Monjardim, pais da cantora Maysa Matarazzo., realizou-se um cocktail seguido do que um cronista social chamaria de “canja amiga”, em homenagem a RADIOLÂNDIA, que foi representada nessa oportunidade por nosso chefe de publicidade, Sr. Leônidas Bastos. Com apenas vinte anos, Maysa alcançou o que muitas pessoas levam muito mais tempo para conseguir. É uma senhora da mais alta sociedade, mãe de um belo menino chamado Jaime e começou sua carreira como cantora gravando um long-playing na RGE sob o título “Convite para ouvir Maysa”, que chamou sobre si a atenção da crítica especializada, e que lhe valeu de parte do nosso colega Jair Amorim o título de “revelação do disco” em 1956. Com um encanto todo seu, Maysa atende seus convidados, enquanto se confessa entusiasmada por conhecer compositores do quilate de um Fernando César e de um Nazareno de Brito: – tu “Aliás, meu próximo disco vai ser “Segredo”, música do Fernando César, a outra face vai ser uma composição minha intitulada “Ouça”. Vou descansar um pouco, mas deverei voltar ao rádio e a TV muito em breve. Não, ainda não sei em que prefixo. Pode dizer que adoro cantar, que sinto em mim uma vocação irresistível desde muito pequenina. Cantar, para mim, faz parte do ar que respiro! – conclui com um gesto muito expressivo de quem quer abarcar o ar que a circunda. Deixamos Maysa entregue a suas ocupações como anfitriã e passamos a anotar os nomes dos presentes a essa simpática homenagem a nossa revista. Entre outros estiveram presentes o Sr. e Sra. Jacques Netter (ele, diretor dos discos RGE), Sra. Hélio da Fonseca, Sr. Francisco Vieira, Sr. e Sra. Paulo Frontin Werneck (ele, diretor da noite Oásis), Sr. e Sra. Fernando Silva, Sr. Hugi Hager, Sr. Caio Furtado, cronista social do “Correio Paulistano”, Sr. Bob Stewart, Sr. e Sra. Aurasil Brandão Joly, Srta. Elsa Laranjeira, Sr. Agostinho dos Santos, maestro Henrique Simonetti, Sr. Fernando César, compositor e cronista da revista “Você”, Sr. Leônidas Bastos, chefe de publicidade de RADIOLÂNDIA, Sr. Nazareno de Brito, compositor e gerente da filial do Rio de Janeiro da RGE, Sr. Mário Duarte, cronista de “O Mundo Ilustrado”, Sr. Leonel Gualter, assistente da filial do Rio da RGE, Sr. Randal Juliano, Sr. Milton Salles, Sr. Osvaldo Miranda,  da RADIOLÂNDIA, “Última Hora” e “Shopping News””, do Rio, Sr. Sílvio Túlio Cardoso, de “O Globo”, Válter Silva e Sra. (ele, divulgador da RGE), Max Gold, representando o departamento de divulgação da Rádio Record no Rio de Janeiro. 


(Reportagem publicada originalmente na revista RADIOLÂNDIA, em 1957)

30 de setembro de 2013

Imprensa: A nova Maysa de sempre - O Cruzeiro, 05/1969


A nova Maysa de sempre






Texto de AFRÂNIO BRASIL SOARES · Fotos de ROBSON DE FREITAS

O show “Maysa de Hoje” que o Canecão vem oferecendo a seus freqüentadores, está se constituindo num dos maiores êxitos que a popular cervejaria já promoveu desde sua criação. Na noite de estreia, sexta-feira última, 1.200 pessoas, que lotavam todas as dependências da casa, aplaudiram de pé a excelente cantora, que teve de voltar oito vezes, ao encerrar-se o espetáculo, para agradecer a euforia dos fãs mais entusiasmados. Maysa está demais. Seus famosos olhos verdes reluziam sob a luz do spotlight, enquanto seu repertório de canções se sucedia num crescente de agrado. Cada vez que uma nova canção era iniciada, entoada pela sua voz quente e seu tom coloquial, as palmas prorrompiam, em, delírio. Às vezes, a plateia parecia tomada por um frenesi coletivo. Em bossa 1969, Maysa reviveu os grandes momentos de sua carreira, interpretando velhos sucessos como “Ouça”, “Meu Mundo Caiu”, “Chão de Estrelas”, “Dindi”, “Eu e a Brisa”, “Canto de Ossanha”, “Se Todos Fossem Iguais a Você”, alternando-os com canções do momento, como foi o caso de “Novo Amor”, de Roberto Carlos, que ela interpretou vestindo uma minissaia preta transparente. Cantora de recursos múltiplos, a parte internacional do show foi um dos pontos altos, quando, como não podia deixar de acontecer, Maysa interpretou, com aquela expressão que a caracteriza, o “Ne Me Quitte Pas” de Jacques Brel. Nino Giovanetti, que a dirigiu, inovou muitos lances, dando maior grandiosidade às possibilidades de Maysa. A mudança de trajes em cena aberta está esplêndida. Por falar em trajes, Maysa veste, inicialmente, uma pantalona preta de cetim com túnica preta transparente. Em seguida, surge com uma túnica branca longa. Retira o manto e aparece com a minissaia negra transparente, ultra-sexy. Enquanto canta, veste por sobre a minissaia um longo branco. Quando interpreta e termina o “Dia das Rosas”, a plateia começa a perceber o fim do espetáculo e passa a aplaudi-la de pé, enquanto forma o coro: “mais um, mais um, mais um”. Ao descer o pano, a plateia não se conforma. As palmas não cessam e Maysa, oito vezes seguidas, tem de voltar para cantar trechos de canção e agradecer a ovação monstro. Sem dúvida, uma temporada para ficar na memória de quantos viram o show. Um show preparado para ser visto muitas e muitas vezes, com Maysa, desta vez, em versão cinemascópica. 


(Reportagem publicada originalmente na revista O CRUZEIRO, em maio de 1969)

23 de setembro de 2013

Imprensa: Maysa: meus erros chegaram ao fim - Radiolândia, 1959


Maysa: meus erros chegaram ao fim



Texto LIBA FRYDMAN · Fotos HILDO PASSOS

Maysa já se encontra na Europa, tendo viajado na tarde de terça-feira, dia 16 deste.
Falando à imprensa antes do embarque, Maysa declarou que ao voltar será outra pessoa. Concordou em que tinha cometido uma série de erros nos últimos tempos, mas que tudo isso seria coisa do passado. Ao regressar, Maysa afirmou que sua vida tomará um sentido diferente e que os erros cometidos não se repetirão. Assim, essa viagem servirá como uma espécie de pausa para reabilitação. Reabilitação para consigo própria, é preciso que se diga, pois os erros de Maysa são, na verdade, de sua única e exclusiva responsabilidade, e se prejudicam a alguém, é a ela própria.
Dias antes, Maysa despedira-se dos parentes e amigos de São Paulo, numa festa que tinha dupla significação: a despedida e a comemoração do seu vigésimo terceiro aniversário. Eis como que se deu a festa:
No amplo salão de festas do Hotel Jaraguá reuniram-se amigos, colegas e representantes da imprensa, para a comemoração do vigésimo terceiro aniversário de Maysa. Atacada por muitos, defendida por outros tantos, Maysa parece não dar muita bola para nada disto em sua festa, elegantíssima em sua “toilette” preta, com um penteado que apesar de ser o último grito da moda, traz sua marca registrada, pois foi feito com suas próprias mãos. Várias “corbeilles”, de amigos que não puderam comparecer, chegaram durante o coquetel, presidido pela cantora e seus pais, o casal Alcebíades Monjardim. Só faltava o pequenino Jayme, que havia cumprimentado sua mamãe com grandes beijos e abraços durante o dia, e já se encontrava repousando em sua caminha, no apartamento dos avós Monjardim.

O estado-maior da RGE compareceu incorporado nas pessoas de José Scatena, Jacques Netter, Henrique Simonetti, Geraldo Lacerda, Orlando Matiaso e os divulgadores Eduardo Sousa Costa e Alberto Ferreira. Mário Duarte, da Organização Vítor Costa, veio trazer seu abraço à amiga e colega, assim como o cantor Abílio Herlander e o compositor Mansueto. Das “Unidas” comparecem Randal Juliano, o rádio-repórter Irineu Sousa Francisco e sua esposa, a atriz e comediante Nair Belo, e a anunciadora Jussara Menezes, José Roberto Lima, “public-relations” da Light e grande amigo do mundo artístico, também compareceu, mais a novata Riva Rosen, que em breve estará estreando no papel-título da peça teatral “O Diário de Anne Frank”. Muita gente da alta sociedade veio dar seu abraço a Maysa, que muito antes de ser cantora profissional já encantava o grupo com sua voz, especialmente nas festas beneficentes. Aliás, os leitores devem estar lembrados que Maysa, no início de sua carreira profissional, doava tudo o que recebia a diversas associações de caridade, só passando a ficar com seus salários integralmente depois do seu desquite. 


(Matéria publicada originalmente na revista RADIOLÂNDIA, em 1959)


16 de setembro de 2013

Imprensa: Norte-americanos vão pagar milhões por Maysa - Revista do Rádio, 1960.


Norte-americanos vão pagar milhões por Maysa

A estrela, em diversos momentos, inclusive em fotos realizadas nos Estados Unidos: lá comprou um guarda-roupa (caríssimo) e visitou Nova Iorque toda. Gostou.


Maysa voltou ao Brasil depois de uma enorme viagem. Esteve duas vezes em Tóquio, percorreu grande parte dos Estados Unidos, e foi a Paris com o fim unicamente de se divertir uma semana com uma amiga! Disse ela contando fatos com orgulho:
-         Voltando do Japão fiquei nos Estados Unidos. Fui direto a Las Vegas, onde perdi todo o dinheiro no jogo. Quis apostar as minhas pérolas no número 13, mas não aceitaram...
-         E daí?
-         Mandei pedir dinheiro a papai. Demorei-me 2 dias em São Francisco e 3 dias em Los Angeles. Ofereceram-me um contrato que não interessava. Conheci Cary Grant, que apesar dos seus 60 anos pareceu-me um “broto”...
-         Nova Iorque, nada?
-         A passagem por Nova Iorque transformou a minha vida de cantora. Fui procurada por empresários. Coube a Irvin Arthur, da Associetad Booking Corporation oferecer-me o contrato mais conveniente para mim. Durantre três anos atuarei nos Estados Unidos e Europa, para boates, televisão, teatro musicado, rádios, discos e cinema.
-         Passará três anos fora do Brasil?
-         Isso não seria possível. Meu filho ficará aqui sob os cuidados de mamãe. De três em três meses terei uma folga para visitar o Brasil e tratar dos meus negócios.

Maysa comentou que tem a sua estreia na Broadway, marcada para o próximo dia 31 de outubro. O seu contrato com a boate “Blue Angel” (conseguido através da ABC), assegurar-lhe-á quatro semanas, com opção para mais oito semanas. E por imposição da cantora, a boate mandará buscar no Brasil, um pianista e um baterista, especialmente para acompanha-la.
-         Quer dizer, Maysa, que você ganhará milhões?
-         Não quero dar cifras do meu contrato. Porém, asseguro que desde Carmen Miranda, os americanos não pagam tão bem a uma artista brasileira.
-         Teve oportunidade para conhecer bem Nova Iorque?
-         A cidade é maravilhosa. Um dia fui ao Champagne Room, do “El Morocco”. Lá estavam Ibrahim Sued, Glorinha, Jackson Flores, Adalgisa Colombo e Alfredo Tomé. Só Alfredo veio falar comigo.
-         Zangada com o colunista social?
-         Não. São coisas do Ibrahim...
-         E agora?
-         Estou no Brasil acompanhada do Odillo Licetti. Sua principal ocupação é fazer-me adaptar ao rigor do contrato americano, além de “treinar-me” no inglês.

Maysa citou dezenas de pessoas ilustres com quem jantou e conheceu. Revelou-nos fatos curiosos dos dias passados no estrangeiro, para onde voltará faturando milhões. Todavia, o mais curioso, é que aqui no Brasil está proibida de falar alto. Tem de manter uma só tonalidade de voz. E com as pessoas que falam inglês, ela só fala mesmo o inglês.


(Reportagem publicada originalmente na REVISTA DO RÁDIO, em 1960)