13 de abril de 2011

Especial:Os Anos Dourados de Maysa



Hoje vou falar de um tema bem interessante – e pertinente – que sempre me vem a cabeça ao lembrar de Maysa, e acho, que também na de todos os nostálgicos dos Anos Dourados. Primeiro, o cenário: a Copacabana dos Anos 50.
A Copacabana dos Anos 50 é descrita como um sonho infinito. O bairro da Zona Sul do Rio de Janeiro, na época, já era aquilo que o tornou famoso no mundo inteiro, não só pela praia – a eterna Princesinha do Mar. Muito mais nobre do que é hoje em dia, Copacabana era estritamente elitizada. Talvez, por isso, concentrava todo o esplendor e a beleza da capital da república. O bairro, era o melhor e mais chique endereço do Rio de Janeiro, à época. (a vizinha Ipanema só viria a se popularizar na década seguinte, impulsionada por sua juventude dourada). Concentrando a maior parte da elite econômica, social e cultural da cidade, Copacabana vivia uma efervescência cultural inédita e poucas vezes vista na história da cidade. Por suas ruas, proliferavam-se cinemas, bares, cafés, teatros e principalmente: uma verdadeira constelação de boates. A boêmia de Copacabana era cosmopolita e inspirada, lá se localizavam as melhores – e mais sofisticadas – boates da cidade; Club 36, Au Bom Gourmet, Dominó, Plaza, Vogue, La Bohéme, Acapulco, Montecarlo, Casablanca e a Meia-Noite do luxuoso Copacabana Palace (por sinal, o prédio mais famoso do bairro) . Lugares onde se fecundava a novíssima Bossa Nova, que também seria responsável por difundir pelo mundo este Copacabana way of life. Era ali que se localizava o histórico Beco das Garrafas, a pequena travessa sem saída na Rua Duvivier que abrigava as famosas boates; Little Club, Bottle’s e Baccarat. O grande berço da Bossa Nova, lugar freqüentado pelos bambas do gênero. Gente como Ronaldo Bôscoli, Roberto Menescal, Luiz Eça, Luis Carlos Vinhas, Baden Powell, Sylvia Telles e Dolores Duran. Pois era nesse caldeirão cultural, que conviviam cantores, compositores, poetas, escritores, políticos, artistas e onde a juventude dourada – e transviada – vivia o seu auge e todo o glamour de uma era que não volta mais.

...

E como Maysa se insere neste cenário fascinante? Totalmente. Maysa viveu o auge dos Anos Dourados, na era de ouro de Copacabana. Que coincidiu justamente, com o período meteórico de sua ascensão ao estrelato musical. Nesta fase, juntou-se a uma trupe verdadeiramente inesquecível. Nas eternas andanças noturnas, Maysa era constantemente vista ao lado de Dolores Duran, Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta), Antônio Maria e Mister Eco. Verdadeiros cronistas da noite carioca dos Anos 50. Ela também era amiga de Sylvia Telles, Paulo Gracindo, Cauby Peixoto, Tito Madi e Samuel Wainer. Amigos com os quais, varou noites embaladas pela boêmia da Princesinha do Mar.
Ela recordava essa época áurea, com absoluto saudosismo, tinha “saudades dos amigos já mortos”, e descrevia aquilo tudo como um verdadeiro sonho. Relatou fatos engraçados, emocionantes e muito nostálgicos. Maysa conta que uma de seus primeiros shows em casas noturnas, foi no Rio de janeiro, no Club 36, localizado justamente em Copacabana, onde ela foi apresentada a Antônio Maria, Stanislaw Ponte Preta, Samuel Wainer e Dolores Duran. “Uma noite em que todos choraram”, e dali por diante foi formado este “bloco” da fina boêmia carioca.
Reza a lenda, que neste mesmo Club 36, de propriedade do francês Paul François Destribats. Onde se apresentava a nata da música brasileira e internacional, Maysa e Dolores Duran teriam cantado durante uma noite inteira com Charles Aznavour – o cantor francês – durante uma de suas passagens pelo Brasil. Que teria achado muita graça quando Dolores o chamou de “gringo”.
Era um saudosismo justificável. Como ela mesma disse, foi uma época onde as relações humanas eram completamente diferentes. (sem generalização). Não existia inveja, raiva ou ódio. Todos se amavam e o  carinho e afeto eram verdadeiros, até aquele “chato” da turma fazia falta, sendo ele desagradável ou não.
São tempos que não voltam mais. Por isso eram inigualáveis, por isso foram dourados. Quantas saudades!

5 de abril de 2011

Coluna: Disco da semana


Convite para ouvir Maysa Nº 3


Ano: 1958
Gravadora: RGE
Faixas:
01-   Mundo Vazio (Antônio Bruno / Amaury Medeiros)
02-  Saudades de Mim (Maysa)
03-  Candidata a Triste (Paulo Tito / Ricardo Galeno)
04-  É Preciso Dizer Adeus (Tom Jobim / Vinicius de Moraes)
05-   Eu Não Existo Sem Você (Tom Jobim / Vinicius de Moraes)
06-  Pedaços de Saudade (Édson Borges)
07-   Fala Baixo (Enrico Simonetti / Maysa)
08-  Suas Mãos (Antônio Maria / Pernambuco)
09-  As Praias Desertas (Tom Jobim)
10-   Maria Que é Triste (Enrico Simonetti / Maysa)
11-    Bom é Querer Bem (Fernando Lobo)
12-   Conselho (Denis Brean / Oswaldo Guilherme)

Análise:
Convite para ouvir Maysa Nº 3 é mesmo um disco de peculiaridades e muitos contrastes, veremos o porque. Na época de seu lançamento, o LP causou um enorme furor, tornando-se objetivo de todo tipo de crítica. O começo da celeuma já se deu durante as gravações. A RGE andava atordoada, por causa do arrebatador sucesso de Convite para ouvir Maysa Nº 2, lançado no começo de 1958, e com isso, não exitou em requisitar Maysa, para a gravação de um novo LP – que ansiavam eles – ser um novo campeão de vendas. Acontece, que a cantora acabara de voltar de uma exaustiva temporada em Buenos Aires e não se encontrava em condições para gravar, Maysa relutou, mas a RGE insistiu. O resultado, já era de se esperar e não demorou a chegar.

Quando o álbum foi lançado, as críticas não demoraram a chegar. O 4º disco de Maysa foi bombardeado por críticas negativas, e outras que tentavam amenizar a situação. A imprensa especializada, dizia que a voz da cantora não remetia à segurança e o brilhantismo do disco anterior, e que a única coisa boa que o LP trazia era a bela foto de capa dos olhos de Maysa em close up. A verdade é que a crítica não estava errada, o álbum parecia mesmo um grande passo em falso. Tudo nele parecia destoar – a voz de Maysa e os arranjos do maestro Simonetti, que não mantinham nem de longe o padrão do álbum anterior.

O disco contava com um ótimo repertório, bem peneirado. Atualizado diante dos melhores sucessos da época, como “As Praias Desertas”, “Eu Não Existo Sem Você”, “Suas Mãos” e “Conselho”. O disco também trazia três novas composições de Maysa, pela primeira vez – duas delas em parceria com o maestro Simonetti – “Fala Baixo” e “Maria Que é Triste” –, e “Saudades de Mim”, uma das melhores canções compostas por Maysa. Tudo isto aparecia ao lado de “Bom é Querer Bem”, clássico de Fernando Lobo e sucesso com Dolores Duran três anos antes.

Apesar dos pontos positivos, o que mais subtraia no LP eram os arranjos e a qualidade da voz de Maysa – muito comprometidos. Por isso, grandes canções acabavam perdendo muito devido a uma orquestração vacilante e arranjos inconstantes. Além disso, a maioria das canções do álbum foram editadas em várias versões diferentes, o que prejudicava ainda mais a qualidade técnica. Mesmo assim, há verdadeiras obras-primas ali, como “Eu Não Existo Sem Você” e “Suas Mãos”.

No somatório final, acredito que Convite para ouvir Maysa Nº 3 não chegua a ser uma lacuna negra na história musical de Maysa. Apesar de todos os fatores contra – e mesmo os poucos a favor, o disco consegue somar mais do que subtrair. Jamais poderia ser tão ruim vindo de Maysa.