7 de fevereiro de 2012

Coluna: Disco da semana


Convite Para Ouvir Maysa


Gravadora: RGE

Ano: 1956

Faixas: *
1-     Marcada
2-   Não Vou Querer
3-    Agonia
4-   Quando Vem a Saudade
5-    Tarde Triste
6-   Resposta
7-    Rindo de Mim
8-   Adeus

* Todas as canções de autoria de Maysa.

Análise:

Todos já conhecem a famosa história de como Maysa foi descoberta, e de como se sucedeu o convite feito por Roberto Corte-Real a Maysa, para a gravação de um disco. Também como todos sabem, o marido de Maysa – André Matarazzo, foi contra. Apenas depois de muita insistência, André consentiu que Maysa gravasse esse disco. Como ela estava grávida na época, uma das condições impostas por André, foi a de que Maysa só gravasse o disco depois do nascimento do seu filho.

Uma das curiosidades que envolveram esse disco, é que o produtor Roberto Corte-Real, era funcionário da gravadora Columbia na época, e quando levou aos seus superiores a ideia de gravar um disco de Maysa. Mas, aos olhos do diretor da gravadora, gravar um disco de uma senhora da sociedade, desconhecida e que sequer era uma cantora, parecia um absurdo. Corte-Real teve que engolir a seco a resposta do diretor da Columbia: “Quantas cópias o marido dela vai comprar?”

Corte-Real procurou então o amigo José Scatena, dono da pequenina RGE, que até então só se limitava a gravar jingles publicitários e discos de quase nenhuma repercussão. Segundo o próprio Scatena revelou anos depois, ele sinceramente não acreditava no sucesso daquela empreitada, mas diante do ineditismo do projeto, resolveu topar pra ver do que daria toda aquela maluquice.

Passado o nascimento do bebê Jayme e o período de resguardo, Maysa pôs-se a gravar. Todas as 8 faixas do LP de 10 polegadas, foram preenchidas com composições de autoria de Maysa, ela não aceitava sugestões e só gravava aquilo que queria. Acompanhada pela Orquestra RGE, conduzida pelo maestro Rafael Puglielli – que ficou famoso pelo programa Música & Fantasia da TV Record na época – também era o responsável pelos arranjos do álbum.

As gravações do primeiro disco de Maysa não foram nada fáceis. Ela era uma novata, nunca tinha entrado em um estúdio de gravação antes e na época, a tecnologia arcaica exigia que se repetissem as gravações de uma mesma música várias vezes até encontrar a melhor versão, porque ainda não existiam os modernos aparelhos de edição atuais. Era quase final de 1956 quando o disco foi finalmente “lançado” nas lojas. Entre a série de restrições impostas por André Matarazzo, estava a de que Maysa não podia exibir seu rosto na capa do disco (por isso a foto da capa é a de um arranjo de orquídeas), nem usar o sobrenome Matarazzo – que só aparece na contracapa do álbum. E o mais importante, era que o disco seria feito em caráter beneficente, toda a renda seria destinada  ao Hospital do Câncer, de Dona Carmen Annes Dias Prudente – o que vetava qualquer possibilidade de carreira profissional de Maysa.

Todas as canções do disco seguem a mesma temática: amores acabados, sofrimentos e tristezas. Qualquer ouvinte perceberia rápido que ali estava uma cantora característica do estilo Samba-Canção – e das boas. São canções que refletem a infelicidade de Maysa em seu casamento e já prenunciavam o fim do enlace matrimonial. Em “Marcada”, “Não Vou Querer” e “Tarde Triste” (seu primeiro grande sucesso), isto fica bem claro. A exceção era “Adeus”, sua primeira composição, escrita por ela quando tinha só 12 anos. É uma letra que fala sobre amizade e despedida, quase banal, mas que ganhou roupagem densa do maestro Puglielli.

Puglielli usou instrumentos mais utilizados em música erudita do que num disco de música popular – Harpa, Oboé e Violoncelo – estão presente nas faixas deste LP. Convite Para Ouvir Maysa é um bom disco, mas o excesso de cordas em algumas faixas prejudica as músicas e a voz pequena e quase rouca de Maysa, o que acaba dando uma cara de “datada” as músicas.

Convite Para Ouvir Maysa era um disco que tinha tudo para não ter acontecido, para dar errado. Um disco de uma cantora desconhecida, que ninguém tinha ouvido falar, e que sequer tinha seu rosto na capa do LP. Era um álbum fadado ao fracasso. José Scatena sabia disso e por isso chamou o locutor Walter Silva (famoso pela dublagem do personagem Pica-Pau no Brasil), um grande entendedor do assunto, pra que ele ajudasse na divulgação do disco de Maysa.

E mais uma vez ela conseguiu driblar a censura de André Matarazzo. Junto com Walter Silva, os dois perambularam pelas rádios de São Paulo e do Rio de Janeiro, na tentativa de desempacar as primeiras 500 cópias do LP. O argumento de Maysa para André Matarazzo foi genial: Não se pode gravar um disco em caráter beneficente sem que ele venda. O disco precisava tocar nas rádios e afinal de contas, gerar alguma renda para que aí sim ele tivesse seu caráter reconhecido.

E não demorou muito pra que isso acontecesse. Em pouco tempo a qualidade daquele trabalho era reconhecida e a voz de Maysa estourava no eixo Rio-São Paulo. A RGE, que estava à beira da falência, foi salva pelo disco desacreditado de Maysa e mandou prensar mais 500 cópias depois daquelas primeiras 500 e assim por diante. A jovem cantora começou a receber vários convites de rádios, shows e televisão...e o resto desta história a gente sabe muito bem qual é.

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