22 de abril de 2013

Imprensa: O grande amor de Maysa Matarazzo - Diário de Notícias, 29/09/1957


O grande amor de Maysa Matarazzo 


Um vestido vermelho entre violinos –
Recordações do colégio de freiras –
Cantar não é pecado – Romance inacabado – A tentação do teatro – O momento sagrado – Tudo em paz – Renunciar? Nunca

Entrevista exclusiva para a Revista Feminina

(Especial para a Revista Feminina)

O auditório estava às escuras. O ensaio havia começado. A orquestra, no palco. Maysa Matarazzo cantava Mea Culpa. O repórter sabia que a entrevista só podia ser feita durante o ensaio. Maysa devia ir ao hotel trocar de roupa, depois atuaria no programa de televisão e, logo a seguir, tomaria o avião de volta para São Paulo. O repórter chegou até a beirada do palco, lápis e papel na mão.

-         Maysa!
A orquestra tocava outra música. O maestro indicava os andamentos aos instrumentistas. E, assim, entre as pausas dos violinos, fez-se a entrevista.
-         Maysa, você sabe que parece uma menina com esses cabelos despenteados?
-         Não tive tempo para ir ao cabeleireiro.
-         Tem uma cabeça de artista jovem e bonita.
-         Jura?
-         Então! Onde nasceu?
-         No Rio. Minha família foi residir em São Paulo quando eu contava três anos de idade.
-         Onde estudou?
-         No Colégio Sacre-Coeur de Marie.
-         Quando começou a cantar?
-         No coro do colégio. Ali também aprendi que cantar não é pecado.
-         Não é, não. A arte resume o que de mais puro existe em todas as religiões.
-         Você disse tudo. Sabia que estudei seis anos de piano?
-         Ótimo. E como iniciou a carreira?
-         Em casa, sem pensar em me tornar profissional. Ouviram-me uns amigos de meu pai, gravaram minha voz em fita. Pouco depois, fiz o primeiro long-playing para a fábrica RGE, em novembro do ano passado.
-         E a sua estreia para o público?
-         Foi no dia 13 de abril, pela TV-Canal 7, da Rádio Record de São Paulo. Nem queira saber a surpresa de muitos, a minha alegria, os debates na família, os comentários dos jornais. Estreia emocionante.
-         É verdade que destina tudo que ganha a instituições de caridade?
-         Sim.
-         E quanto ganha?
-         Vinte e cinco contos em cada programa de televisão no Rio, vinte e cinco contos em cada programa de televisão em São Paulo. Falando em cruzeiros, cinqüenta mil cruzeiros semanais. Cantar não é pecado...
-         Pretende fazer tournées?
-         Mais tarde, talvez.
-         Algum dia pensou em escrever romance?
-         Comecei, parei no meio, não tinha título.
-         Que heroína de peça teatral desejaria viver?
-         Alma, personagem surrealista da comédia de Sophie Rosenhaus O Ambutis.
-         Sophie Rosenhaus?
-         É uma autora desconhecida, mas que terá fama, breve.
-         Qual o trabalho em casa que você mais gosta?
-         Nenhum. Em casa, o meu prazer é cuidar do filho e ouvir música.
-         O que mais aprecia no Rio?
-         Tudo. O Rio.
-         E em São Paulo?
-         Detesto o clima.
-         Qual a mulher mais elegante, a carioca ou a paulista?
-         A mulher brasileira.
-         Como se inspira para compor suas músicas?
-         Em casa. A melodia surge em mim, distante, até que se apossa de toda a minha sensibilidade. Canto a melodia, fazendo a gravação na fita. Depois, eu mesma escrevo a letra. É um momento sagrado. Vou ao piano e faço o acompanhamento. Minhas canções são dolentes, sentimentais: Tarde triste, Adeus, Mundo novo... a última intitula-se Felicidade triste. A música é o meu grande amor.
-         Maysa, reconstituiu definitivamente o seu lar?
-         Sem, graças a Deus.
-         Ninguém, falará mais em desquite?
-         Ninguém, graças a Deus.
-         Algum dia poderá renunciar à carreira artística?
-         Isso, nunca.
A sonoridade vibrante dos violinos no palco era como um convite irresistível à música. Maysa Matarazzo despediu-se do repórter. 


(Publicado originalmente no jornal DIÁRIO DE NOTÍCIAS, em 29 de julho de 1957.)

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