8 de maio de 2010

Especial: Os amigos


Os amigos



Maysa era uma artista especial, não só como artista, também como mulher e ser humano. E com toda sua personalidade apaixonante adquiria amigos e admiradores por onde passava. E é por isso, que hoje a equipe do blog oficial Maysa decidiu dedicar um especial as histórias destes eternos companheiros.

Desde o começo de sua carreira, por onde passava Maysa já angariava uma legião de admiradores, sejam eles do meio artístico ou não. Não era complicado se apaixonar pela encantadora Maysa, sejam levados pelo seu talento nato ou apenas estonteados com tanta beleza, Maysa de imediato conquistou o público e grande parcela do meio artístico. Algo incomum, pois o normal como seria de se esperar é a famosa hostilidade por parte dos outros cantores que já estavam no mercado antes dela e agora teriam mais uma rival pra lutar pelo alcance da popularidade na escalada ao sucesso.

Mas ao contrário de tudo isso, Maysa que já despontou ao cenário musical com grande êxito, recebeu chuvas de críticas positivas, além disso não eram poucos os compositores e jornalistas do eixo Rio - São Paulo que gastavam centenas de folhas de papel e muita tinta celebrando a própria Maysa e seu talento em suas inúmeras colunas nos jornais da época, eram nomes de respeito como os de: Denis Brean, Ricardo Galeno, Antônio Maria, Nazareno de Brito e muitos outros.

‘Ah, você está vendo só do jeito que eu fiquei e que tudo ficou, uma tristeza tão grande nas coisas mais simples que você tocou.’ O lamento triste de Por Causa de Você traduz perfeitamente o lamento pela ausência de Dolores Duran. Nela, Maysa via muito mais que uma fiel amiga, ela era a personificação de uma irmã que Maysa nunca chegou a ter. As duas são figuras chave do samba-canção com características musicais quase idênticas e origens muito distintas. Ambas eram compositoras de extremo talento que abordavam as mesmas histórias nos versos celebrados de Castigo, Ouça, Fim de Caso ou Meu Mundo Caiu. Eram grandes intérpretes e cantavam em diversos idiomas. É difícil definir o que teria unido tanto Maysa e Dolores, talvez além disso tudo já dito, a admiração mútua e o espírito boêmio e independente das duas. Dolores era alguns anos mais velha que Maysa, possivelmente, ela veria em Dolores um modelo de cantora e artista a ser seguido. Ela jamais se recuperou da perda da saudosa amiga, para sempre ficaria a vontade de homenagear Dolores Duran, vontade impressa em uma extensa lista de gravações da amiga por toda discografia de Maysa. É complicado escrever sobre uma relação tão carinhosa sobre duas figuras tão passionais, pode-se dizer que Maysa e Dolores são as personificações perfeitas do amor e nada mais.

Pelas mãos do grande Antônio Maria, Maysa receberia memoráveis críticas, a maioria positivas. Ele era um de seus maiores entusiastas e fã assumido, na pessoa de Maysa ele via a personificação exata do samba-canção. Dele, ela gravaria em 1958 a belíssima Suas Mãos que se eternizou em sua voz, o lamento sintomático e o dramático clamor dos versos da canção pareciam o lamento da própria Maysa, tal foi à associação. Mas a língua grande de Antônio Maria, também não deixaria de atingir Maysa. Ele não a poupou nunca do dito ‘absurdo’ que teria sido para ele a gravação de O Barquinho e do disco homônimo de bossa nova, para ele Maysa teria sido corrompida pela turma da nova onda e estaria traindo vulgarmente o samba-canção, as críticas não foram poucas, muito menos boas. Mas o talento de Antônio Maria era maior que sua enorme língua e assim como perdoou suas insistentes investidas, Maysa também perdoaria as duras ferroadas.

E o que dizer sobre Silvio Caldas? Um monstro sagrado da música brasileira, que acompanhou Maysa desde criancinha. Era com ele, que ela cantava Barracão ainda pequena nas noitadas homéricas na casa da família Monjardim, foi com Silvio que uma soberba Maysa contava as amigas que aprendera a tocar violão. Quando ela resolveu gravar a histórica Chão de Estrelas composição de Silvio em parceria com o amigo Orestes Barbosa, logo vieram as expectativas dos discófilos, pois Maysa foi a primeira cantora á grava-la depois de Silvio Caldas, porque curiosamente todos tinham uma certa desconfiança de grava-la para evitar comparações com a versão maravilhosa de Silvio. E Maysa foi lá e fez. Dito e feito, ninguém imaginaria que ela fosse dar a versão definitiva para aquela que é o símbolo máximo do cancioneiro do Brasil. Chão de Estrelas se eternizou na voz de Maysa.

Amigos também eram Vinicius de Moraes e Tom Jobim, a famosa dupla de que Maysa gravou mais de uma centena de músicas dada a sua identificação com o trabalho deles. Para os dois, Maysa não poupava elogios, aliás, os fãs mais observadores vêem no poético Vinicius um pouco da nossa também poética Maysa. Os versos tão celebrados das canções da dupla, ás vezes em parcerias com outros grandes nomes como os de Adoniran Barbosa, Carlos Lyra, Aloysio de Oliveira ou Edu Lobo, se eternizaram na voz de Maysa, tal foi à assimilação imediata. Canções que ás vezes se dissociam de seus autores para se integrar a própria alma de Maysa. Não importa que sejam músicas com viés dramático como a eterna Eu Sei Que Vou Te Amar, uma música que já nasceu como um clássico da MPB, ou então a belíssima Se Todos Fossem Iguais a Você, uma canção que se tornou uma constante na vida de Maysa e mais uma vez se eternizaria em sua voz. Mas a lista é extensa demais e por mais músicas da dupla que ouvirmos em sua voz, restará uma única certeza: pouco importa quando estas músicas estão ligadas á nomes tão importantes, quando estas são transpostas pela voz de Maysa ela as assume como sua própria autora, como se fossem trabalhos de sua própria alma.

Mas não podemos falar sobre amigos e não citar a eterna dupla Ronaldo Bôscoli e Roberto Menescal, que tem a vida entrelaçada ao nome de Maysa em casos e acasos divertidíssimos. Junto à turma da bossa nova liderada pelos dois e composta por outros grandes nomes como os de Luiz Eça, Luis Carlos Vinhas, Bebeto Castilho e Élcio Milito, Maysa viveria histórias famosas como a histórica turnê á Argentina e ao Uruguai que lançou a bossa nova no exterior, uma turnê recheada de casos delirantes com direito a uma guerra de bombinhas entre Maysa e Bôscoli, mais parecida a uma hecatombe atômica que quase "decretou"a prisão do grupo inteiro na capital portenha em tempos instáveis da política Argentina. Menescal já á conhecia de longa data, desde as férias infantis no Espírito Santo, para sempre Maysa veria nele a figura de um grande amigo registrado em uma canção composta por ambos anos depois. Com Bôscoli, Maysa ainda viveria um tórrido e conturbado romance que resultou no fim do noivado dele com a ainda desconhecida Nara Leão. Os dois pareciam realmente feitos um para o outro, com personalidades fortes e até certo ponto bem parecidas, igualmente boêmios, temperamentais e intensos, e seria essa mesma intensidade que detonaria brigas homéricas de cenas mais parecidas com os filmes de Hollywood. Na turnê em Buenos Aires, convidados para um jantar em um tradicional restaurante da capital, Maysa e Bôscoli trocaram desaforos durante toda à noite, provocada por ele não deixaria barato! Na mesma hora, desafiada ergueu os joelhos e virou a mesa perante todos os convidados. O romance não duraria muito tempo apesar dos inúmeros reencontros ao longo de vários anos. Famoso e igualmente polêmico é o histórico LP Barquinho de 1961, produzido por Ronaldo Bôscoli e com arranjos de Roberto Menescal, Luiz Eça e Luis Carlos Vinhas, um dos principais discos de bossa nova da MPB que trazia em si a composição mais conhecida da dupla Bôscoli e Menescal: O Barquinho. Luiz Eça e Menescal ainda fariam a produção do emblemático LP de Maysa: Ando Só Numa Multidão de Amores de 1970, nele Maysa registraria sua única composição com o amigo Menescal, a autobiográfica Me Deixe Só. Dessas amizades, restaram todas estas histórias inesquecíveis, pois como reza a música de Milton Nascimento: ‘Amigo é coisa pra se guardar debaixo de sete chaves.’



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