3 de agosto de 2010

Coluna: Disco da semana


Voltei

Gravadora: RGE – XRLP 5.078
Ano: 1960
Faixas:
1- Meditação (Tom Jobim / Newnton Mendeonça)
2- Alguém me Disse (Jair Amorim / Evaldo Gouveia)
3- Carinho e Amor (Tito Madi)
4- Voltei (Maysa / Enrico Simonetti)
5- Sincopado Triste (Hianto de Almeida / Macedo Neto)
6- Qualquer Madrugada (Hianto de Almeida / Chico Anysio)
7- Solidão (Antônio Bruno)
8- Cheiro de Saudade (Djalma Ferreira / Luiz Antônio)
9- Dindi (Tom Jobim / Aloysio de Oliveira)
10- Vem Comigo (Maysa / Enrico Simonetti)
11- Cantiga de Quem Está Só (Jair Amorim / Evaldo Gouveia)

Análise:
Quando Voltei chegou às lojas de todo país em junho de 1960, o Brasil constatou que a renascida Maysa estava flertando abertamente com a inovadora Bossa Nova. O álbum Voltei é o que se pode chamar de um trabalho de transição. Em pelo menos meia dúzia das faixas deste disco, é notável a batida da ensolarada Bossa Nova, estilo que começava a ganhar repercussão no Brasil após a gravação dos históricos álbuns Canção do Amor Demais, de Elizeth Cardoso e Chega de Saudade, de João Gilberto, em 1958. 

Em Voltei, o agito da Bossa Nova ainda dividia espaço com os tradicionais boleros e samba-canções do repertório da cantora. A capa era um deleite a parte: uma belíssima foto em P&B de Maysa aparecia ao lado de grafismos geométricos coloridos, ultramodernos para a época. Além de uma delicada dedicatória manuscrita – “Com carinho de Maysa” – um alto contraste para com o título do álbum (Voltei) escrito em letras garrafais amarelas e laranjas.

Para começar, a primeira faixa do LP – a histórica “Meditação”, de Tom Jobim e Newton Mendonça já inaugurava o novo capítulo musical na carreira de Maysa. A canção que eternizaria a expressão “O amor, o sorriso e a flor” como definição daquele novo estilo musical que ainda engatinhava, também seria gravada pelo Baiano João Gilberto, naquele mesmo ano de 1960, apesar do arranjo da música conter a típica marcação contagiante da Bossa Nova, a voz de Maysa habituada ao tom passional do Samba-Canção, soava grandiloquente demais aos mais atentos ouvidos bossa-novistas. A Faixa seguinte “Alguém me Disse”, parecia não pertencer ao mesmo disco da histórica “Meditação”. “Alguém me disse que tu andas novamente, de novo amor, nova paixão, todo contente”; a música era um delicioso bolero da dupla Jair Amorim e Evaldo Gouveia, que Maysa gravou acompanhada por órgão eletrônico.

Bolero também era a encantadora “Qualquer Madrugada” – “Ligo a vitrola, dou folga a empregada, espero você qualquer madrugada”, obra do grande Chico Anysio em mais uma de suas mil facetas. Um dos maiores êxitos do LP era uma inspirada interpretação para “Dindi”, de Tom Jobim e Aloysio de Oliveira, lançada no ano anterior por Sylvia Telles. A música anos depois, se tornaria um dos maiores clássicos da carreira de Maysa. 

No disco, ela respondia pela autoria de apenas duas canções – “Voltei” e “Vem Comigo” – as duas em parceria com o maestro Enrico Simonetti, que novamente assinava pela regência e os arranjos do disco. em “Voltei”, a faixa-título do disco ela ressurge autobiográfica, lançando mão de um apelo: “Voltei, com meus olhos, com meus versos, e a todos eu peço que me aceitem como sou”. Já em “Vem Comigo”, um sambinha envolvente, via-se a nova visão de Maysa sobre a vida: “Vem, vem ver comigo agora, você que tão triste chora, o lado bonito da vida”. Porém, o maior sucesso do LP foi “Cantiga de Quem Está Só” – um irresistível bolero da dupla Jair Amorim e Evaldo Gouveia, que conseguiu a proeza de se manter três meses seguidos no topo das paradas de sucesso de todo o Brasil.

Voltei , reunia boleros, samba-canções, e autênticas bossas-novas com muita harmonia e delicadeza, inaugurando uma nova página no extenso livro musical de Maysa. É um disco maravilhoso, envolvente e habilmente delicado ao reunir canções de estilos diversos. Voltei fez um ótimo sucesso, as vendas foram turbinadas pela mídia espontânea que Maysa recebeu ao reaparecer em grande estilo. Na contracapa - texto assinado por José Bonifácio de Oliveira Sobrinho – o famoso Boni, que alguns anos depois viria a se tornar um dos homens fortes da futura TV Globo:

“A idéia inicial era essa: Maysa escreveria sua própria contra capa. (1) Ela não escreveu (2) e aqui estamos para isso. Escrever sobre Maysa é difícil. Já disseram muito e nada. Maysa volta. Quem é que volta? Volta quem ficou. Volta quem é conhecido. Você conhece Maysa? Eu também não! E falo com ela. E a cantora Maysa, conhece? Conheço também. Canta como ninguém. Já disseram? (3) Ah...sim! Boa lembrança. Maysa voltou com brilho de vida nos olhos grandes! E o que é Maysa se não a vida? O que é que Maysa tem? (4) Maysa é!
1- Seria melhor que ela escrevesse. Ninguém conheceria Maysa mais do que Maysa.
2- Talvez ela não conheça Maysa...ou, então, é falta de tempo. Os novos contratos de Maysa são para todo território nacional. E, ainda mais, Maysa dedica-se a enfermagem. Faz bem para outros e para ela.
3- Sobre Maysa cantora tudo já foi dito. Eu só acrescentaria: dizer alguma coisa cantando é muito enjoado. Maysa é o inverso. Canta dizendo “tudo”. Gosto dela.
4- Tem um filhinho lindo. Tem uma personalidade comunicativa e contagiante. Tem amor pela música. Esta fora deste mundo. Maysa é!”

(O álbum foi relançado em CD totalmente remasterizado com pela gravadora Som Livre em 2009.)