29 de junho de 2010

Coluna: Música da semana


"Demais"

Maysa (1964)


Maysa (1966)

Canecão apresenta Maysa (1969)


Autores: Tom Jobim e Aloysio de Oliveira

LPs: Maysa (1964), Maysa (1966), Canecão apresenta Maysa (1969)

Análise:
Poucas vezes na música brasileira uma intérprete se apropriou tanto de uma música como Maysa tomou "Demais" para si. Foi uma associação imediata, que faz com que pouca gente se lembre que a música é de autoria de Tom Jobim numa parceria com Aloysio de Oliveira, deixando os desavisados de plantão creem que a música é obra da própria Maysa. É bem verdade que ela apresenta uma grande semelhança com o clássico norte-americano "The End Of a Love Affair", música que Maysa já havia registrado no mítico LP Maysa Sings Songs Before Dawn de 1961. Basta comparar as duas canções para tirar a prova, mas, agora a sensação daquela música em sua voz era totalmente diferente. Se a canção não era obra dela, ao menos tinha livre inspiração em sua pessoa.

A música já havia sido gravada anteriormente por Sylvia Telles em 1959 e ainda receberia inúmeras interpretações posteriores em vozes consagradas como as de Ângela Rô Rô e Ney Matogrosso. Mas nenhuma interpretação conseguiu superar a originalidade da de Maysa. A identificação foi imediata e aqueles versos “Todos acham que eu falo demais e que ando bebendo demais, que essa vida agitada não serve pra nada, andar por aí, bar em bar, bar em bar.” Se tornaram quase um prefixo dela.

O primeiro registro da canção na obra da cantora data do espetáculo histórico no Au Bon Gourmet em 1963. Após uma introdução triunfal que incluía alguns acordes de "Ouça", ela entrava em cena arrasadora cantando os primeiros versos de "Demais". Aquela música, com um significado tão forte, cantada na voz de Maysa em ritmo de desabafo, tinha um efeito devastador na mente e principalmente no coração, ali, após os últimos versos da canção ela emendava em uma versão ainda mais desconcertante de "I’Ve Got You Under My Skin" de Cole Porter, sucesso na voz de Frank Sinatra. Era realmente de tirar o fôlego da platéia. "Demais" parecia ter sido feita para a própria Maysa, tal foi a assimilação entre intérprete e música. Felizmente, a temporada antológica seria lembrada em um marcante LP ao vivo lançado pela famosa gravadora Elenco do mesmo Aloysio de Oliveira.

Daí por diante, "Demais" se tornou uma constante em sua carreira, marcante, também se tornou a versão combinada em pot-pourri com "Meu Mundo Caiu" e "Preciso Aprender a Ser Só", a famosa Fantasia de Trombones. Lançado pela primeira vez no LP Maysa de 1966, era uma versão glamourosa e muito grandiosa, repaginada por um toque jazzístico. Esta primeira versão também se tornou famosa por ser o tema de abertura da minissérie Maysa – Quando fala o coração de 2009 que narrou a vida e obra da cantora. "Demais" ainda acompanharia Maysa naquele mesmo pot-pourri em sua antológica temporada no Canecão em 1969, também lembrada em um famoso LP ao vivo.

A canção em tom de desabafo, expõe as aflições e os percalços do personagem principal que anda com a vida agitada, falando e bebendo demais. Rodeado pelos comentários maledicentes de muita gente que acha que ele não larga o cigarro e dirige seu carro correndo e chegando sempre no mesmo lugar. O que ninguém sabe é que isso acontece porque ele vai passar a vida esquecendo, fugindo de um amor. É por isso que ele fala demais, que ele bebe demais, e a razão por que ele vive essa vida agitada demais, é porque o seu amor é enorme demais. Ora, era uma clara licença poética da vida de Maysa, uma vida agitada levada entre garrafas, cigarros e amores.

Mas se não temos esta, podemos ter apenas uma certeza – Demais é Maysa e Maysa é Demais.



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