Maysa muito mais Maysa
Texto de João Luís de Albuquerque
Com fotos de Hélio Santos
O show devia começar na calçada. Uma
limusine negra, La Salle 1935, com chofer japonês, estacionaria todas as noites
em frente ao Au Bon Gourmet. De casaca vermelha, o porteiro, bom crioulo de
1,90m, estenderia a passadeira grená até o carro. Maysa, vestido preto e
comprido, com as costas nuas e vison
branco sobre os ombros entraria na boate escura.
Mas,
o bom crioulo sumiu, o alfaiate não entregou a casaca e o japonês ficou sem ter
o que fazer: na véspera da estreia a limusine quebrou o diferencial. Mas o show business brasileiro também must go on, e Maysa estreou na data
marcada para um público assustado.
Quem
na noite já tem muitas horas de palco sabe que o maior prazer de Maysa sempre
foi o de devorar platéias. Barulho de gelo no copo de uísque já foi motivo já
foi motivo para que ela interrompesse e acabasse com muito show.
As
músicas vão passando e cada um entendendo menos. No final todos se perguntam:
“O que houve com Maysa?” sempre existiu o mito Maysa. A que mantinha o público
à distância, a que transmitia sua poesia sem se importar com a opinião de
ninguém.
-
Para
mim não existe público e não quero que ele entenda ou sinta nada. Existe apenas
minha vontade enorme de cantar.
Mas
no Au Bom Gourmet o público vê Maysa pela primeira vez simpática, como se
cantasse na mesa de cada um. Como se a todos perguntasse, “vocês estão me
entendendo?” tudo sem a máscara de tragédia, sem canto da boca retorcido para
baixo. Apenas com um sorriso. De simpatia.
Cantando
alguns antigos sucessos, levando o público ao delírio com Buquê de Isabel, Dindi, Bom Dia Tristeza, Lamento, Maysa lota o Au Bon Gourmet até nas segundas e terças-feiras.
Além da inegável qualidade artística do show,
muita gente vai duas vezes ao Au Bon Gourmet “ver para crer” na transformação
de Maysa.
(Reportagem publicada originalmente no CADERNO B do JORNAL DO BRASIL, no dia 29 de maio de 1963.)
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